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Na Itália, redesenhar a natureza pode ajudar a limpá-la

01/10/2008

Foto: The New York Times

Pescador em pântano poluído na Itália. Especialista do MIT quer solucionar o problema com um redesenho do ecossistema
 

Especialista sugere criar novos ecossistemas em ambientes danificados. Suas idéias incluem redirecionar o fluxo da água e mover montanhas.

Elisabeth Rosenthal The New York Times

Antes de Michele Assunto arrastar sua rede de pesca do canal em Terracina, Itália, ele usa uma vara para tirar o lixo do caminho. "Eles realmente precisam limpar isso aqui", reclama.

No local onde outro canal deságua no mar na pequena comunidade de Porto Badino, os únicos animais que conseguem sobreviver são ratos gigantes, afirmam agentes do governo local. Obviamente, o mar não é apropriado para banho por 180 metros em cada lado da saída, acrescentam, dando de ombros – ainda assim, os banhistas se esbaldam no Mediterrâneo ali perto.

Em muitas partes desta região costeira abastada ao sudeste de Roma e nordeste de Nápoles, canais que jogam no Mediterrâneo efluentes de fazendas e fábricas coexistem com pescadores e banhistas. Sem dúvida, esta área precisaria de grandes esforços para voltar ao seu estado mais primitivo. Para lugares longínquos como esse, no entanto, um novo grupo de paisagistas recomenda uma solução radical: não só restaurar o ambiente, mas também redesenhá-lo.

"Está tão ecologicamente desequilibrada que, se continuar assim, vai acabar matando a si própria", disse Alan Berger, paisagista do Massachusetts Institute of Technology, que entrevistava pessoas, empolgado, por entre os canais de cheiro ruim, falando com pescadores como Assunto.

"Não podemos matar a economia e mudar as pessoas de lugar", acrescentou. "Ecologicamente falando, não podemos restaurar a região; temos que seguir em frente, dar um novo caminho a esse lugar".

Criar novos ecossistemas

Desenhar a natureza pode parecer um paradoxo ou um ato de extrema arrogância. Mas, em vez de simplesmente recomendar que fazendas e fábricas que poluem sejam fechadas, Berger é especialista em criar novos ecossistemas em ambientes severamente danificados: redirecionando o fluxo de água, movendo montanhas, construindo ilhas e plantando novas espécies para absorver a poluição, para criar paisagens naturais, apesar de "artificiais", que podem definitivamente sustentar a si próprias.

Berger, fundador do projeto P-Rex (Project for Reclamation Excellence) do MIT, recentemente assinou um acordo com a província de Latina para elaborar um grande plano ecológico para as áreas mais poluídas da região.

Ele quer que o governo compre uma extensão de terra de quase 200 hectares em um vale estratégico através do qual as águas mais poluídas passam hoje. Ali, ele pretende criar uma área molhada que serviria como uma estação natural de limpeza antes que as águas sigam para o mar e áreas residenciais. 

Obviamente, é necessária uma regulamentação para impedir o despejo de poluentes no canal. Mas uma mistura cuidadosa do tipo certo de plantas, terra, pedras e canais de drenagem filtrariam a água à medida que ela flui suavemente. A terra também funcionaria como um novo parque.

Berger foi rápido em reconhecer que a abordagem é bastante diferente do tipo normalmente defendido por grupos ambientalistas estabelecidos como o World Wildlife Fund ou o Nature Conservancy, que geralmente buscam restaurar a terra ou preservá-la em seu estado natural, geralmente interditando ou limpando agentes poluentes locais. No Florida Everglades, por exemplo, o estado está comprando e fechando uma fábrica de açúcar para preservar o meio ambiente. Mas essa abordagem pode não funcionar em lugares que já estão terrivelmente degradados, disse Berger.

"A diferença entre eu e o WWF é que quando eu olho para este lugar, nunca penso em voltar ao passado", ele disse, referindo-se à vida selvagem. "A solução tem que ser tão artificial quanto o lugar. Estamos tentando inventar um ecossistema no meio de uma paisagem completamente modificada e poluída".

À primeira vista, Latina não parece uma zona de desastre ambiental. Contornada por montanhas a leste e o Mediterrâneo a oeste, é um lugar de vistas rurais espetaculares e até alguns resorts de praias famosos, como o Sabaudia.

De fato, todo o ambiente natural aqui já é fabricado – e com sucesso, pelo menos em termos econômicos. 

Prosperidade

Dois mil anos de "gerenciamento de água" tornaram Pontine Marshes (que antes era infestado de malária) em uma região, a província de Latina, que está entre as mais prósperas da Itália. Lá existem muitos parques industriais, resorts cheios de residências de fim de semana e fazendas – algumas delas fazem da Itália o maior produtor de kiwis do mundo.

A prosperidade de Latina é construída em áreas de pântano drenadas, mantidas habitáveis por seis bombas tão grandes e barulhentas quanto aviões, postas em funcionamento em 1934, por Mussolini. Diariamente, elas drenam milhões de litros de água da terra encharcada, direcionando o fluxo para um sistema elaborado de canais que finalmente despejam a água no mar.

Toda a província voltaria a ser uma terra de pântano em sete dias se as bombas fossem desligadas, afirmou Carlo Cervellin, do Consórcio Pontine Marsh.

Imperadores romanos e papas tentaram por séculos drenar o pântano para permitir melhor acesso ao mar ao longo da famosa Via Apia, todos com sucesso limitado. A drenagem do Pontine Marshes era um dos trunfos de engenharia de Mussolini.

O que emergiu dos pântanos foi o triunfo da determinação fascista, assim como uma das usinas mais poderosas da Itália. Mussolini construiu a cidade de Latina na terra recém-drenada, onde se tornou um centro industrial e de agricultura. 

Sustentabilidade

Mas próspero não necessariamente significa sustentável.

Berger veio para a Academia Americana de Roma em 2007 através de uma bolsa de estudos de um ano para estudar a história do Pontine Marshes. Somente depois de ter começado a coletar dados sobre a terra e a água é que ele se deu conta do quanto a área estava degradada.

Com a ajuda do governo local em Latina, ele coletou milhares de fotografias aéreas, assim como dados da água e do solo em um esforço para documentar padrões de drenagem e o fluxo de água e poluentes.

"Se existe um lugar para saber exatamente onde sua comida é produzida, esse lugar é aqui", ele disse. "Eu mesmo só comeria o que é produzido em cima dos montes".

Águas límpidas chegam á planície de Latina vindas de altas montanhas na área de Ninfa; elas se tornam cada vez mais sujas à medida que fluem em direção ao mar, coletando o escoamento de uma sucessão de fábricas, fazendas e lares.

Berger descobriu que metade da água no sistema estava gravemente contaminada, com níveis de fósforo e nitrogênio que pioram à medida que a água corre através dos canais em direção à costa.

"Em termos de fósforo, muito da água está no nível residual, e em termos de nitratos, a água está no nível de sujeira dos suínos – como se tivesse acabado de passar por uma fazenda de porcos", ele disse.

No momento em que a água alcança o mar em algumas saídas, fotos aéreas de Berger mostram, ela se torna uma pluma de lama cheia de poluentes. Companhias farmacêuticas e grandes fazendas estão dispostas ao longo dos canais. Agricultores também usam a água para irrigação.

Ao serem apresentados a essa pesquisa, até mesmo agentes do governo local se surpreenderam com o retrato da poluição, mas ficaram impressionados com a solução que ele propôs e continuam a trabalhar com ele, depois que ele voltou dos Estados Unidos.

"Ele estudou a zona a partir de um ponto de vista diferente do nosso", disse Carlo Perotto, o diretor de planejamento da província. "Tínhamos pessoas diferentes preocupadas com diferentes elementos: água, indústria e agricultura. Ele inaugurou uma nova forma de pensamento".

(© G1)

 

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