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Fuksas examina a dinâmica da nova urbe

22/10/2000

 

 

VENEZA - O arquiteto italiano Massimiliano Fuksas é o curador da 7ª Bienal de Arquitetura de Veneza, que termina no dia 31 tendo reunido alguns dos maiores nomes da arquitetura mundial - como Jean Nouvel, Richard Rogers, Renzo Piano e Paolo Soleri - em torno da discussão do tema da sobreposição da estética sobre a ética dentro da atividade.

  Até o secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, se pronunciou sobre a discussão levada a cabo nos 35 pavilhões dos Giardinis de Veneza. "As cidades estão no centro de um processo contrastante, passando do material ao imaterial", ponderou Annan em mensagem à Bienal. Para falar do problema das grandes cidades no mundo contemporâneo, o curador da mostra recebeu a reportagem do Estado.

   Estado - O tema da 7ª Bienal de Arquitetura de Veneza é Less Aesthetics and more Ethics, ou seja, "Menos estética e mais ética". Mas anteriormente havia a palavra cidade (Città: Less aesthetics and more ethics) no título. Por que foi retirada?

   Massimiliano Fuksas - Porque já se sabe que a cidade é o palco dos grandes conflitos e dos grandes problemas, portanto sua presença já está implícita.

   É necessário explicar, entretanto, o que significa no caso "ética" - a ética do título da Bienal seria o maior empenho dos arquitetos para melhorar o futuro. O futuro é o ambiente, a tecnologia, a pobreza, a falta de água e tantos outros problemas. O arquiteto não resolve, mas participa. Todos sabem que o arquiteto não é a solução de todos os problemas, mas sabemos também que se um local é mal construído ou mal planejado, não funciona. Portanto, eu peço aos arquitetos e principalmente a mim mesmo um ato de generosidade para conseguirmos mudar alguma coisa, para participarmos de um processo, de uma idéia! É isso. Essa é a idéia da Bienal. Deverá ser uma Bienal que nos dê coragem, que nos faça reencontrar a vontade de sermos ativos na sociedade, de não nos submetermos a ela!

  Estado - E avaliando os projetos apresentados o sr. acha que houve uma compreensão desse significado?

   Fuksas - Segundo a minha opinião, as idéias apresentadas são extraordinárias! Se conseguíssemos colocar em prática tudo o que se falou, que se pensou...

   Estado - Pode-se dizer que essa é uma Bienal que busca aproximar as pessoas da arquitetura e a arquitetura da realidade das pessoas?

   Fuksas - Exatamente! Eu queria que fosse uma Bienal que falasse ao grande público! Eu penso que a primeira coisa a ser feita e torná-la popular!

   Porque até os dias de hoje a Bienal de Arquitetura foi sempre uma coisa que não interessou a ninguém que não fosse arquiteto ou algum outro profissional ligado ao assunto. Despertar a atenção das pessoas para a arquitetura é ajudá-las, educá-las e dar a elas um meio de comunicar-se. A linguagem normalmente usada na arquitetura é um dialeto incompreensível para a maior parte do mundo, impedindo a sua participação efetiva na sociedade.

   Estado - Hoje existe uma realidade social conflituosa na Europa Ocidental devido aos diversos movimentos migratórios em sua direção, provenientes, principalmente, da África e do Leste Europeu. Isso influenciou na escolha do tema da Bienal?

   Fuksas - Sim.

  Estado - E influenciou também as propostas apresentadas?

   Fuksas - Foi um fato importante para aproximadamente 50% dos projetos. Esse é um problema mais abordado pelos arquitetos jovens.

  Estado - Como o sr. pensa que as políticas urbanas dos países desenvolvidos europeus enfrentarão esse problema?

   Fuksas - O país mais avançado na reflexão desse tema é a França, onde existe o problema da imigração árabe iniciada há 40 ou 45 anos atrás. A França vive com aproximadamente 5 milhões de árabes e africanos. Eles foram transportados ao seu território em uma certa época, quase todos trazidos para trabalhar na indústria, como mão-de-obra de baixo custo, evitando os operários franceses já "excessivamente" sindicalizados. Foram construídos para esses imigrantes africanos e árabes, já nos anos 60 e 70, bairros monstruosos, horrendos. Além disso, com a crise da falta de trabalho, o fenômeno da especialização e da "new economy", essas pessoas foram ejetadas do mercado de trabalho definitivamente. Então o Estado francês decidiu ajudá-las e criou uma lei para sustentar os desocupados, mas não foi o suficiente. Portanto, existe um conflito econômico, social e urbano enorme na organização do território francês. A Itália, ao contrário, se encontra no ponto de origem do mesmo problema, ou seja, agora precisamos construir as casas para os imigrantes. O drama se encontra agora aqui. Nós seremos capazes ou não de projetar as casas para os refugiados e para os novos imigrantes que sejam partes de uma cidade, lugares, bairros? Serão lugares onde se poderá viver ou serão sempre guetos fabricados por nós? Porque a Bienal é também isso, é a casa dos refugiados. Ou seja, chegam os imigrantes: e aí? Com todos os juízos que nós podemos ter sobre os albaneses, por exemplo, que são um dos povos menos amados sobre a face da terra, sejam juízos certos ou errados, isso não quero discutir, mas o problema real é que existe uma pressão muito grande sobre a Europa. Alguma coisa deve ser pensada e feita sobre essa situação, senão a Europa não vai agüentar.

   Estado - Falando um pouco sobre Internet, TV e meios de comunicação, tenho lido muito sobre as conseqüências dessas tecnologias na dinâmica dos centros urbanos. O que o sr. acha desse assunto?

   Fuksas - Na minha opinião, a Internet não é um novo meio de trabalhar, mas um novo meio de controlar a informação. O problema não são as informações em si, mas seu controle. Com a Internet, um grupo pequeno de pessoas pode gerir uma infinidade de informações e de relações. Descobriu-se também que a informação é mais importante que a produção. Há uma grande demanda pela informação em todo o mundo e é nesse sentido que devemos dar a resposta. Eu acredito que a Internet também pode ser usada em termos democráticos. Nós nos encontramos ao início do século 21 em situação semelhante a que estávamos ao início do século 20, quando possuíamos pela primeira vez muita tecnologia disponível e podíamos usá-la de forma positiva ou negativa, mas após 15 anos decidimos fazer uma guerra mundial. Hoje, podemos usar a tecnologia de modo a dar informação a qualquer pessoa no mundo e assim educá-la, ajudá-la. Democracia para mim, hoje, é informação. Ofereceremos aquilo que sabemos e os recursos que temos à maior quantidade de pessoas possível ou continuaremos a restringir esse conhecimento à elite? Não podemos mais restringir os benefícios à elite porque se passou um século, somos uma sociedade de massa, a globalização é um fato e temos de afrontar seriamente o problema, caso contrário seremos vencidos por ele. Não há escapatória.

  Estado - Entendo. O problema urbano originado na revolução industrial não foi resolvido...

   Fuksas - Foi retardado. Nós o retardamos com as guerras. Porém é um problema que deve ser resolvido agora, pois as guerras já não são suficientes para contê-lo. As guerras só agravam o problema e o tempo é muito curto...

   Estado - Sim, o mundo é muito pequeno!

   Fuksas - Exato. Por esse motivo não se pode mais fazer uma guerra sem que você mesmo sofra as suas conseqüências. Não se pode bombardear a Iugoslávia e pensar que não haverá conseqüências. As conseqüências são muito simples, as pessoas deixam seu país, milhares de iugoslavos migram para a Áustria e o partido fascista vai ao poder. É hora de resolver os problemas de forma harmônica em termos globais.

  Estado - O sr. conhece muitos países e, conseqüentemente, diversas soluções para os mesmos problemas urbanos. Há alguma solução específica que lhe fez refletir em particular?

   Fuksas - Sim. A primeira coisa que é necessário aceitar é o princípio de que uma sociedade deve ser multiétnica e logo multilingüística, multirreligiosa, multirracial. Aceitando esse princípio vemos que as cidades começam a ser interessantes. Por exemplo, vejamos Tóquio. Em Tóquio, às 5 da tarde todos os empregados saem de seus trabalhos, retiram suas gravatas, abrem suas camisas e vão beber nos diversos bairros, na parte alta e baixa da cidade, mas juntos. Passa-se de uma escala muito alta a uma escala muito pequena, que é constituída de "barracos" de madeira muito tradicionais, circundados por edifícios muito altos e moderníssimos. Portanto, essa dimensão, essa cidade nova que convive e coincide com a cidade antiga é uma das coisas que mais me fascinaram em Tóquio. O sistema de transportes, elemento central para o bom funcionamento de uma cidade, também é muito eficiente em Tóquio.

   Um segundo fato fundamental é que hoje vivemos em sociedades sem identificações com suas respectivas história e geografia. Devemos aceitar que hoje a maior parte dos habitantes de uma cidade não nasceu ali e não possui em si a história dessa cidade. Por isso, deve-se proteger tanto o lugar do habitante como o habitante do lugar. O "lugar" deve ser protegido, pois quem não o conhece não se identifica com ele e o destrói. Mas é necessário também proteger esse habitante da dominação do lugar. Há um trabalho enorme a ser feito. Existem, é claro, casos que funcionam muito bem. Na minha opinião, Nova York é uma das cidades que hoje funcionam melhor no mundo. Eu creio que a cidade de NY de hoje seja conseqüência do fato de a cidade ter adquirido uma história própria. Ou seja, houve uma apropriação via mídia de NY como um local onde as pessoas se sentem em casa. Você vai a NY e se sente nova-iorquino. É isso! Devemos transformar as cidades em um local onde não é necessário ter raízes, mas em um local onde você se encontra há três meses e já se sente originário dessa cidade. Quando nós conseguirmos fazer as pessoas se sentirem pertencentes à cidade onde vivem teremos então dado novamente a esse lugar uma geografia. Essa é uma palavra importante - geografia - e teremos dado às pessoas um lugar onde possam viver. (Cristiana Sabóia, OESP)


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