Pergunta Como o senhor resumiria o cenário do mercado de trabalho hoje?
Domenico
De Masi Tenho um amigo que trabalha como executivo num banco e uma outra amiga que
é grande atriz do teatro italiano. Sempre que os dois se encontravam em festas na minha
casa ou em férias no campo, ela me dizia: Esse seu amigo parece sempre tão triste.
A expressão dele é tristíssima!. Na verdade, ele era a síntese do burocrata.
Trabalhava tanto que quando estava fora do seu esquema habitual se sentia perdido. Em
resumo, os profissionais hoje descansam pouco e trabalham muito. Até as horas de descanso
giram em função do trabalho. Isso gera uma insatisfação e infelicidade enormes, um
cansaço que mina cada vez mais a capacidade de ter boas idéias.
Pergunta O
que há de errado nas empresas de hoje?
De Masi
Se você observar as empresas, vai ver que o marketing e os processos de produção
evoluíram, e a tecnologia avançou incrivelmente. Enquanto isso, as políticas de
recursos humanos mudaram tão pouco que parecem as mesmas de cem anos atrás. Os processos
de produção são outros e a tecnologia permite milhões de novas possibilidades e
facilidades, mas a organização do trabalho ainda é aquela criada pelas necessidades de
uma era anterior à nossa.
Pergunta O
senhor crê que uma mudança de hábitos esteja a caminho?
De Masi A
Nova Economia e a Internet estão imprimindo uma necessidade incrível de velocidade às
mudanças. É uma revolução que vai num ritmo cada vez mais veloz. Se pensarmos que as
pessoas levaram 700 anos andando em carruagens até inventarem o automóvel, e em 70 anos
os carros já andavam com mais do que o dobro da velocidade inicial, podemos ter uma
idéia de como ritmo é e vai se tornando cada vez maior.
Pergunta
Como uma empresa pode tentar fugir do perigo de não inovar ?
De Masi
As empresas que estimulam seus funcionários a ficar no escritório 10, 12 horas por dia
estão fadadas a transformar todos os seus colaboradores em burocratas, exaustos e
incapazes de enxergar além do óbvio e de ter idéias brilhantes sobre o negócio em que
atuam. É uma burrice achar que o trabalho está limitado ao expediente no escritório. O
trabalho precisa ser complementado por pelo menos dois elementos fundamentais: os
processos lúdicos, que eu resumo como jogos, e o estudo. Sem isso, o trabalho está
condenado a se confinar no escritório e se transformar numa coisa puramente neurótica
que aos poucos esgota qualquer possibilidade de prazer. Sem esse prazer, não há
criatividade possível e, com a velocidade que as novidades da tecnologia vêm criando, os
que não perceberem isso ficarão para trás.
Pergunta O
que o senhor considera importante na formação de um profissional?
De Masi
Quando falo em estudo não estou falando da coleção de títulos, de ficar apenas se
debruçando sobre cursos de especialização na área de formação ou lendo livros sobre
esse assunto. Isso é importante, mas falo também de ler coisas diferentes, assistir a
filmes, conversar com as pessoas, se dar o direito de contemplar coisas belas. Não digo
só de uma bela obra de arte, mas encontrar beleza numa cena cotidiana, conseguir
encontrar serenidade para simplesmente parar e olhar o movimento das pessoas, da natureza.
Isso é uma coisa belíssima. Estas são as coisas que desenvolvem os sentidos, a
sensibilidade e dão asas à criatividade.
Pergunta A
redução da jornada de trabalho ainda é uma enorme polêmica no mundo todo. O senhor
acha mesmo que se tornará realidade em curto prazo?
De Masi
Hoje temos computador, Internet, milhões de facilidades que deveriam diminuir o tempo de
trabalho e não aumentá-lo. Esse tempo que sobra deve ser aproveitado em atividades
lúdicas e diversão. Assim, as pessoas têm mais prazer e se produzem as grandes idéias.
Por que exigir um expediente de oito horas no mínimo, com horário de entrada e saída,
em vez de estipular tarefas e prazos e deixar que os funcionários decidam como organizar
seu tempo? Além de ser menos neurótico, isso economizaria milhões em gastos com luz,
equipamentos e manutenção dos escritórios.
Pergunta
Nem todas as empresas pensam dessa forma.
De Masi A
maioria das empresas não utiliza de forma inteligente o que a tecnologia oferece. Acham
que o lucrativo é produzir cada vez mais com menos gente trabalhando. Isso cria
profissionais frustrados, neuróticos, estressados e que têm uma relação de
dependência e ódio com o trabalho. Burocratas, em resumo. E esses são os piores
inimigos da criatividade. Não é ficando 12 horas num cubículo que alguém vai pensar em
algo brilhante. As idéias se produzem em qualquer lugar, menos nos escritórios.
Pergunta
As organizações saberão como aproveitar funcionários mais criativos?
De Masi
Não basta às empresas despertar em seus funcionários a criação de idéias. A maioria
das pessoas tem uma grande capacidade de pensar coisas fantásticas, mas uma enorme
dificuldade para colocá-las em prática (os fantasiosos) ou tem um enorme senso prático
e grande força realizadora, mas nem sempre têm idéias brilhantes (os concretos). A
empresa que conseguir unir esses dois tipos ou que encontrar as raras pessoas que
conseguem unir as duas potencialidades verá coisas incríveis acontecerem.
Pergunta
Por onde se deve começar?
De Masi
Os departamentos de recursos humanos deveriam começar a pensar no que oferecer aos
funcionários para que eles sejam mais felizes. Só assim vão conseguir ter funcionários
que produzem idéias realmente eficientes. Hoje, as pessoas dedicam 90% do tempo ao
trabalho, e é preciso ter mais alegria e menos estresse. Para isso, o RH deveria pensar
em oferecer luxos aos seus funcionários. O que é um luxo? É uma coisa que é rara. Quem
consegue organizar a vida de modo a ter mais tempo, tem mais luxo do que os que não
conseguem, por exemplo. A empresa deve se preocupar não só com isso, mas, por exemplo,
com a beleza e o espaço onde as pessoas trabalham. Os escritórios deviam ser menos
impessoais, mais agradáveis, o espaço é muito importante no processo de criação.
Outros luxos são a maior autonomia, a segurança e a alegria. O sucesso das
organizações dependerá de sua capacidade de oferecer essas coisas aos seus
colaboradores.