ROMA - As comemorações dos 500 anos do Descobrimento
do Brasil passam por Cremona, cidade situada no norte da Itália perto de Milão,
considerada a capital mundial do violino. É a terra dos grandes mestres lutiers Andrea e
Niccolò Amati, Andrea Guarneri e do mítico Antonio Stradivarius que aperfeiçoou ao
máximo o instrumento.
No programa há uma exposição
de instrumentos de cordas e arcos construídos por artesãos brasileiros
no palácio da prefeitura da cidade, um concerto com músicas de
Villa-Lobos e até um sarau com convidados ilustres, oferecido pela
família mais importante de Cremona.
A mostra vai até domingo e foi inaugurada com a 9ª Trienal Internacional
dos Instrumentos em Arco - o maior evento de luteria do mundo.
"Pela primeira vez, o Brasil aparece numa vitrine internacional,
comprovando a qualidade de sua produção nessa área", diz o pernambucano Saulo
Barreto, presidente da Associação Brasileira de Luteria, que organizou o evento em
colaboração com o Consulado do Brasil em Milão, a prefeitura de Cremona e a Trienal.
Estão na mostra 13 instrumentos construídos por sete artesãos de
vários Estados brasileiros: São Paulo, Bahia, Minas Gerais, Pernambuco, no mesmo
palácio que expõe de forma permanente quatro dos violinos mais preciosos do mundo: Carlo
IX de França, de Andrea Amati, construído em 1566; Hammerle, de 1658, feito por Niccolò
Amati; Quarestani, em 1689, por Giuseppe Guarneri e o Cremonese, que Stradivarius fez em
1715 e cujo valor os especialistas avaliam em cerca de US$ 4 milhões.
Em sua longa carreira (1643-1737), Stradivarius, que aprendeu a profissão
com Niccolò Amati, produziu mais de mil instrumentos em arco e cordas, centenas deles de
excepcional qualidade porque ele combinava sua genialidade com o uso perfeito dos
materiais, das formas e dos produtos químicos.
"Todos pensam que o violino é como o vinho: quanto mais velho,
melhor; isso não é verdade, o instrumento novo também pode ser bom e estamos provando
isso", comenta Barreto, que estudou a arte de fabricar instrumentos em cordas na
célebre escola internacional de luteria de Cremona, onde um curso dura entre quatro e
cinco anos.
Enquanto a luteria européia e italiana em particular atravessa um
período de crise, é muito ligada à tradição e há receio de inovar, no Brasil está
no começo, portanto há mais liberdade para ousar. Além disso, o mercado de orquestras
é bem maior que o europeu, segundo Barreto. Mesmo assim a produção brasileira de
instrumentos de cordas é prejudicada pela proibição de uso do pau-brasil.
Graças ao peso e elasticidade, o pau-brasil é ideal para fazer
instrumentos de cordas, enquanto os violinos (arcos) são produzidos com madeiras
européias. Mesmo proibido para venda, o pau-brasil sai ilegalmente do País para a
Europa, os Estados Unidos e o Japão. "Quem está no exterior leva vantagem porque
quando o carregamento chega aqui as autoridades nem sabem que tipo de madeira é e, dessa
forma, enquanto os estrangeiros produzem milhões de instrumentos, os brasileiros estão
parados sem poder usar uma riqueza que é nossa."
Dois violinos, uma viola e um violoncelo brasileiros vão ser usados no
sarau que amanhã vai comemorar o Descobrimento com músicas de Villa-Lobos e Nino Rota. A
festa vai ser no palácio da marquesa Ana de Cavalcabò - família histórica de Cremona -
e terá autoridades brasileiras, representantes da aristocracia européia e descendentes
da casa real brasileira: d. Manuel e d. Maria da Glória de Orleans e Bragança.
As comemorações terminam sábado com um concerto no teatro Città Nuova,
onde o renomado Quarteto Italiano vai tocar, com instrumentos brasileiros, o Quarteto nº
1, de Villa-Lobos; Quarteto para Arcos, de Nino Rota, e a Suite Aritana, de João
Linhares, composta para a ocasião. (Assimina Vahlou, OESP)