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Pontecorvo quer coalizão para
produção latina de cinema |
11/10/2000
O cineasta italiano Gillo Pontecorvo, 81, convidado do Festival do
Rio BR 2000, defendeu a criação de um "star system" latino como forma de
reagir à hegemonia do cinema norte-americano.
Em entrevista à Folha, Pontecorvo, autor de filmes políticos como "A
Batalha de Argel" (1965) e "Queimada" (1969), sugeriu a coalizão de
vários países latinos com o objetivo de criar uma indústria calcada na fama de atores e
atrizes, exatamente como nos moldes de Hollywood.
"É ridículo que, atualmente, um ou dois filmes franceses cheguem à
Itália por ano. É preciso que o cinema latino vire moda", disse. A obra de
Pontecorvo é alvo de uma retrospectiva no festival. O diretor, que não filma desde
"Ogro" (1979), disse que tem dois projetos em mente, ainda embrionários.
Mas seus esforços, como membro do conselho de diretores da Cinecittà,
estúdio de cinema italiano estatal, têm sido para estimular parcerias e intercâmbio
entre a Itália e os países latinos.
Na luta contra a hegemonia de Hollywood, Pontecorvo fala em
"trincheira", sabendo que o projeto de um "star system" latino é
ambicioso. "Mas a situação é gravíssima. Um povo que não produz filmes é como
uma casa sem espelho. E, sem espelho, não podemos conhecer nossos defeitos e nossas
potencialidades", disse.
O diretor italiano lamentou a falta de engajamento político do cinema atual,
acreditando, porém, que se trata de um fenômeno passageiro. "Isso é reflexo da
sociedade, da TV, da globalização. Mas vai passar", disse.
Sobre as críticas comumente direcionadas ao gênero do cinema político,
Pontecorvo afirma que são "superficiais e mecânicas". "É estúpido dizer
que o cinema político não é arrojado esteticamente, que não contribui para a linguagem
cinematográfica. Tudo depende do diretor, se ele é ou não de alto nível. Não tem nada
a ver com o gênero", disse.
Pontecorvo dividiu as atenções da abertura do festival, na quinta-feira,
com o diretor inglês Terence Davies, 55, cujo filme "A Essência da Paixão"
inaugurou a mostra.
O filme conta as agruras de Lily Bart (Gillian Anderson, a agente Dana
Scully, de "Arquivo X"), mulher que sofre preconceito por ser pobre, na
sociedade nova-iorquina do início do século.
Terence Davies, também em entrevista à Folha, no hotel Copacabana Palace,
zona sul do Rio, justificou o ritmo lento do filme afirmando que ele obedece ao período
retratado. "É uma época em que o tempo passa devagar, não há rádio, televisão,
barulho exterior", defendeu.
Ainda que sutilmente, Terence Davies mais uma vez volta à questão
autobiográfica, marca de sua carreira, ao escolher um tema em torno da pobreza. O diretor
nasceu numa família católica de Liverpool. Era o mais novo de dez irmãos, três dos
quais morreram ainda bebês. Seu pai era limpador de chaminés.
No princípio de carreira, Terence Davies fez uma trilogia autobiográfica,
em curtas de 16 mm, com duração de 101 minutos. Com seu primeiro longa, "Vozes
Distantes", ganhou o prêmio da crítica no Festival de Cannes de 1988.
Terence Davies tem uma visão crítica do atual cinema britânico, a despeito
do sucesso de bilheteria internacional de filmes como "Ou Tudo ou Nada"
("The Full Monty").
Nesse ponto, ele pensa o oposto de Gillo Pontecorvo. "Não podemos
competir com Hollywood. Eu me revolto por causa dessa obsessão dos ingleses em copiar os
americanos. "Ou Tudo ou Nada" não é cinema, é televisão", disse.
Terence é da tese de que quanto mais local, mais universal um filme é.
"Só com um olhar verdadeiro sobre nós podemos criar uma linguagem interessante, que
possa ultrapassar fronteiras", disse. (Cristian Klein, FSP)
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