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Aos 120 anos, Pinóquio nasce mais uma vez

11/10/2002

 

 


Boneco ganha versão politizada e é levado ao século 20 em mostra do cartunista italiano Sergio Staino em SP

DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL

   Aos 120 anos, recém-completados, o boneco de madeira criado por Gepeto está mais popular do que nunca. Disputado por grandes estúdios e editoras, Pinóquio esteve (em "A.I. - Inteligência Artificial", de Spielberg) e estará (em "Pinocchio", de Roberto Benigni) nas telonas; acaba de ganhar reedições em livro ("As Aventuras de Pinóquio", em versões da Iluminuras e da Cia. das Letras); e é centro das atenções na mostra "120 Anos de Pinóquio", no Sesc Pompéia.

   Dividida em duas partes, a exposição é uma parceria com o Istituto Italiano di Cultura São Paulo e a Fondazione Nazionale Carlo Collodi, dona de uma extensa coleção de livros, ilustrações, pinturas e filmes que retratam o boneco das mais diferentes formas.

   A seção "Pinóquio pelo Mundo" mostra as diversas adaptações que o personagem sofreu neste mais de um século de existência em várias culturas. "Pinóquio está vivendo uma nova vida. O filme de Benigni tem provocado muita polêmica na Itália, em torno das interpretações que suscita", afirma Guido Clemente, 60, professor do Istituto Italiano di Cultura. "A mais popular ainda é a de Walt Disney."

   Além da famosa animação de 1940, serão exibidos no evento mais três filmes: o longa "Le Avventure di Pinocchio", com Gina Lollobrigida; a animação "The Adventures of Pinocchio"; e o musical de 1976 "Pinocchio".

   Mas a grande novidade do evento é mesmo a mostra "Pinocchio Novecento", do cartunista italiano Sergio Staino. Num resgate da interpretação original da história de Collodi, Staino volta a politizar o personagem. O artista transporta o ingênuo afilhado de Gepeto para o conturbado século 20, onde se depara com personalidades "do mal", que fariam a Raposa Manca e o Gato Vigarista corarem de vergonha.

   Em cartaz até 26 de outubro, "120 Anos de Pinóquio" é ainda -alguém duvida?- uma ótima opção para as crianças. Além de peças de teatro, o evento terá monitores para atender a garotada.


120 ANOS DE PINÓQUIO - mostra de livros, ilustrações, pinturas, filmes, peças e workshops sobre o personagem Pinóquio. Onde: Sesc Pompéia - área de convivência (r. Clélia, 93, Pompéia, SP, tel. 0/xx/11/3871-7700). Quando: de ter. a sáb., das 9h às 20h30; dom., das 9h às 19h30. Até 26/10. Quanto: entrada franca. Patrocinadores: Sadia e Consolato Generale d'Italia San Paolo.

(© Folha de S. Paulo)

Pinóquio ganha versão para o cinema, com o italiano Roberto Benigni, e exposição em São Paulo

Século de mentiras

LUCIA HELENA ISSA
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DA ITÁLIA

   Cavalos azuis, fadas, borboletas gigantes, construções surreais. Uma cidade cenográfica está nascendo em Papigno, Úmbria, a 150 km de Roma, em uma das regiões medievais mais mágicas da Itália. No local, o cineasta italiano Roberto Benigni, 48, do premiado "A Vida É Bela", está construindo o mundo de "Pinocchio", uma das maiores produções da história do cinema italiano.

   "Pinóquio", a fábula escrita por Collodi em 1882, conquistou várias gerações de crianças, com a saga do menino feito com pedaços de madeira pelo carpinteiro Geppetto. Um menino irreverente, inteligente, cujo nariz crescia a cada vez que ele omitia a verdade ou uma parte dela. O que talvez poucos saibam é que a história se transformou em uma das maiores obras da literatura universal e no livro mais vendido no mundo depois da Bíblia e do Corão. O texto de Collodi foi traduzido em 150 países, da China a El Salvador.

    "Pinóquio" é uma obra de puro fundamentalismo, mas um fundamentalismo da alegria. É um personagem que sempre sonhei interpretar, mas somente agora, que tenho quase a idade de Gepeto, posso fazer o Pinóquio... O personagem fascina porque é contraditório, uma mistura de Dom Quixote, Fausto, Hamlet e Édipo. É como um bombardeio de alegria, mas também de dor, perdas, buscas e de todos os ingredientes da vida... É até engraçado, pois a idéia de produzir "Pinocchio" vem sendo alimentada há tempos, mas só ganhou forma agora, em um momento nada afetuoso para a humanidade", diz Roberto Benigni, radiante, enquanto caminha pelo set com jornalistas de todo o mundo.

   O filme, escrito por Roberto Benigni e Vincenzo Cerami, é uma produção da Melampo Cinematográfica, a produtora independente fundada por Benigni e sua mulher, Nicoletta Braschi.

   Para construir o universo de "Pinocchio" foram construídas três cidades cenográficas, com 3.000 m² cada uma.

   Papigno, a cidadezinha umbra localizada no chamado "cuore verde di Itália", parece ter entrado em total simbiose com o cinema italiano e, por aqui, cada morador orgulha-se de abrigar o maior complexo cinematográfico da Europa. A simbiose procede. Segundo o produtor-executivo de "Pinocchio", o romano Mario Cotone, "o filme é uma produção inteiramente italiana, desde os 250 artesãos que trabalham na cenografia, passando pelo diretor de fotografia, Dante Spinnoti, até chegar aos protagonistas: Benigni (Pinocchio), Carlo Giuffrè (Geppetto), Peppe Barra (Grilo Falante) e Nicoletta Braschi (Fada)".

   "Pinóquio carrega dentro de si todas as contradições do mundo. Reler o livro foi quase como redescobrir um hino à vida. Além disso, o filme quer resgatar o olhar infantil no imaginário coletivo", completa Benigni.

   No set, chama a atenção o nome de Danilo Donati, 75, um dos grandes magos da cenografia italiana, que trabalhou com Federico Fellini e Franco Zefirelli nos anos 60 e foi o criador do cenário de filmes como "Romeu e Julieta". O cenógrafo, que descobriu o cinema aos 17 anos, afirma que hoje tem que "aceitar compulsoriamente os efeitos especiais realizados pelo computador".

   "Pinocchio", produção cujo valor total gira em torno de 40 milhões de dólares, chega aos cinemas no próximo Natal (no Brasil, estréia 24 de janeiro). Até lá, os artesãos do senhor Donati estarão trabalhando em plena harmonia com a face high-tech, dando cores e formas aos sonhos de Benigni.

(© Folha de S. Paulo)

"Walt Disney traiu Pinóquio", diz cartunista italiano Sergio Staino

DA REPORTAGEM LOCAL

   Esqueça aquele boneco fofinho, de bochecas coradas e olhos azuis que Walt Disney eternizou no longa de animação "Pinocchio", de 1940. O personagem imaginado pelo escritor florentino Carlo Lorenzini Collodi (1826-1890), no final do século 19, nasceu como uma sátira ao tradicionalismo da sociedade italiana da época.

   O desenhista Sergio Staino, 62, que, como toda criança nascida na Itália, já conhecia a história de Pinóquio antes mesmo de aprender a ler, parece não ter se esquecido disso.

   "Walt Disney traiu o personagem. Fez um Pinóquio muito superficial. No livro, Pinóquio é um garoto muito curioso, que tenta entender o mundo e, em 90% das situações, não escapa de monstros, serpentes e outras situações graves", destaca Staino, que está no país para a abertura da exposição e para uma palestra amanhã, às 19h30, no Istituto Italiano di Cultura (r. Frei Caneca, 1.071, SP, tel. 0/xx/11/3285-6933). "E isso me lembrou de tantos momentos terríveis do nosso século 20, como o Holocausto, a bomba atômica, esses grandes pavores coletivos, que são de certa forma reportados no livro de Collodi."

   "Pinocchio Novecento", em cartaz no Sesc Pompéia até o dia 26, é portanto uma tentativa ora bem-humorada, ora sarcástica de recuperar esse viés. Gepeto, por exemplo, vira Albert Einstein: "Ele é um velho jogador, habilidoso e tentado a construir um boneco de acordo com suas vontades". Mestre Cereja, que, no original, presenteia Gepeto com a "matéria-prima" do boneco, é Sigmund Freud: "Ele fica preocupado que aquele pedaço de tronco que fala seja a manifestação da psiquê".

   A lista de "monstros" inclui ainda Mussolini (o domador de circo), Berlusconi (o burrico), Carol Wojtla (a baleia), Tony Blair (policial), entre muitos outros.

   Na Itália, Staino é mais conhecido por seu personagem Bobo, que estreou nas páginas da revista de quadrinhos "Linus" em 1979. Atualmente, publica suas charges no jornal "Corriere de la Sera" e na revista "Unitá", de orientação liberal. (DA)

(© Folha de S. Paulo)

 

Imprensa estrangeira critica cineasta Roberto Benigni

Da AFP

   A associação de correspondentes estrangeiros credenciados na Itália enviou nesta quarta-feira uma carta ao cineasta italiano Roberto Benigni para protestar contra a proibição feita aos jornalistas estrangeiros de assistirem ao lançamento na Itália de seu novo filme "Pinocchio", que será exibido ao público a partir de 11 de outubro.

   Segundo os colaboradores do cineasta, a decisão foi tomada porque a versão do filme para o público estrangeiro será diferente da preparada para o mercado italiano, que é mais longa.

   "Não só não fomos convidados, mas sua assessoria de imprensa definiu nossa presença 'absolutamente não-apreciada'", escreveu o jornalista dinamarquês Peter Loewe, vice-presidente da associação, à qual pertencem os principais jornais do mundo.

   "Se o lançamento de Pinocchio é um evento mundial (...) a exclusão da imprensa internacional é ainda mais incompreensível", sustenta o crítico de cinema Loewe, representante dos jornais "Dagens Nyheter" (dinamarquês) e "Hufvudstadsbladet" (finlandês).

   Para Loewe, a política de marketing do cineasta italiano "nos obriga a escrever o que os demais opinam".

   "O jornal 'Il Messaggero' escreveu que o filme decepcionou a crítica. Será verdade? Não podemos dizer, já que não vimos nem o filme nem seu realizador", concluiu.

   O filme foi apresentado somente à mídia italiana. A imprensa estrangeira foi afastada também da entrevista coletiva que ocorreu depois da exibição.

   Benigni, que obteve sucesso internacional com "A Vida é Bela", premiado em Cannes e ganhador de três Oscar, tem sido alvo de ataques da mídia local por seu comportamento, definido excessivamente orientado para a própria promoção comercial.

   Os fotógrafos italianos que cobriram a cerimônia, na segunda-feira passada, na qual Benigni recebeu o título de doutor honoris causa da Universidade de Bolonha, não puderam entrar na sala porque as imagens foram concedidas de forma exclusiva a uma empresa, Melampo Cinematografica, de propriedade do artista.

   Os fotógrafos se vingaram publicando uma única foto sem o rosto do ator.

(© Diário Online)

 

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