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Comitê investiga consulado italiano

03/10/2002

 

 


Tradutora diz que houve falsificação de documento em concessão de cidadania

DA REPORTAGEM LOCAL

   O Comites (Comitê de Italianos no Exterior), órgão oficial do governo italiano, instaurou uma comissão de inquérito para investigar supostas irregularidades na concessão de cidadania italiana e na emissão de vistos pelo Consulado Geral da Itália em São Paulo, ocorridas a partir de 1997.
Entre outros pontos, a comissão de inquérito, formada em junho, apura eventuais responsabilidades do atual cônsul italiano em São Paulo, Gianluca Cortese.

   A comissão funciona como uma CPI. O resultado da investigação deve ser enviado ao Ministério da Justiça e à Procuradoria da República da Itália.

   A principal testemunha, a tradutora Leonora Giuliana Caterini, 45, depôs anteontem na comissão e entregou documentos -inclusive papéis internos do consulado- referentes a três casos. A Polícia Federal investiga um deles.

   Leonora Giuliana diz ter descoberto a falsificação do certificado de nascimento de um italiano. A suposta fraude, ocorrida em 1997, teria o objetivo de viabilizar a aprovação da cidadania de um descendente.

   Segundo a tradutora, que já encaminhou pedidos de cidadania para cerca de 25 jogadores de futebol de salão amador, dados armazenados nos computadores do consulado afirmam que Geremia Zorzenon nasceu em San Stino di Livenza.

   Só que um registro antigo da igreja, incluído na documentação, revela que Zorzenon nasceu em Fumicello, localizada em antigo território austro-húngaro anexado pela Itália em 1920. Em 1997, não era permitido conceder cidadania aos descendentes de nascidos nessa região, o que foi alterado em 2000.

   Leonora também apresentou um documento do consulado, de 2001, sobre o pedido de cidadania para o jogador de futebol de campo André Augusto Leone, o Dedé.

   Segundo esse documento, o pedido de cidadania entrou e foi viabilizado no mesmo dia -em data em que o serviço estava fechado para o público. Normalmente, esse processo demora meses.

   A tradutora também apresentou documentos para mostrar que o consulado tentou impedir que um funcionário prestasse depoimento na Polícia Federal, que investigava o uso de certidões falsas na concessão de 61 vistos turísticos para peruanos, em 2001.

   Pierpaolo Savio, que exercia o cargo de chanceler chefe, acabou depondo e negou conhecer qualquer irregularidade no consulado. Ele respondeu a um procedimento disciplinar e foi envidado de volta à Itália.

   "A prova de cidadania falsa está aí para quem quiser ver. É uma prova de irregularidade, não tenho dúvida", afirmou a tradutora.

   Para o presidente da comissão de inquérito, Francesco Scavolini, os documentos mostram que é preciso seguir com a investigação. "Precisamos passar tudo isso a limpo", afirmou Scavolini.
Ele solicitou documentos ao consulado e depoimento do próprio cônsul à comissão de inquérito, mas teve resposta negativa.

   Existe uma divisão no Comites em relação à investigação. Para o presidente do comitê, Claudio João Pieroni, os documentos entregues à comissão antes do depoimento de anteontem se referem apenas "reclamações, e não denúncias de irregularidades".

   Pieroni diz que os membros da comissão de inquérito vão analisar os novos documentos encaminhadas por Leonora antes de decidir o futuro da investigação. "Se não houver prova de irregularidade, a comissão de inquérito deve ser destituída, e essas reclamações devem ser apuradas por uma comissão de trabalho", disse.

 

OUTRO LADO

Cônsul-adjunto nega ocorrência de irregularidades

DA REPORTAGEM LOCAL

Leia a seguir nota oficial sobre o caso, divulgada ontem pelo Consulado Geral da Itália em São Paulo e assinada pelo cônsul-adjunto, Luigi Estero.

   "O presidente do Comites (Comitê dos Italianos no Exterior de São Paulo), Cláudio Pieroni, nos informou que a comissão de investigação citada possui apenas documentação de procedimentos administrativos ordinários referentes ao reconhecimento da cidadania italiana.
Devido ao grande volume de processos de reconhecimento da cidadania italiana que este Consulado Geral examina pode acontecer que, em alguns casos, ocorram queixas que, no limite possível, esta representação consular sempre procurou acolher da melhor forma.

   A documentação que se encontra atualmente em poder da referida comissão refere-se exatamente a esse tipo de inconveniente. Por este motivo, o presidente Pieroni nos informou que tal documentação será enviada da Comissão de Investigação para a Comissão de Relações com o Consulado, que sempre encarregou-se desse tipo de problema. Até a presente data não temos conhecimento de ulteriores documentações em poder da Comissão de Investigação.

   Com relação à emissão de vistos para cidadãos peruanos, desejo esclarecer que, graças a periódicas inspeções internas no setor de vistos, foi possível identificar casos de concessão de vistos mediante a apresentação de documentação de identidade falsificada. Foi uma preocupação do cônsul-geral da Itália, Gianluca Cortese, denunciar o ocorrido às autoridades brasileiras e italianas que, por sua vez, instauraram um inquérito para as necessárias averiguações.

   Com relação à senhora Giuliana Caterini, pessoa conhecida deste Consultado Geral por acompanhar, pelo que me consta, com muita frequência processos relativos à cidadania italiana em particular de jogadores de futebol, muitas vezes a mesma solicitou a este Consulado Geral e a nossa embaixada em Brasília informações sobre o andamento destes processos.

   As autoridades diplomáticas italianas no Brasil sempre responderam, nos limites de quanto é permitido pela legislação italiana, a estas requisições, assegurando, porém, o respeito das normas administrativas que regulam, de modo rígido, esse tipo de processo, que se estimam em milhares de casos.

   Com relação aos casos citados pela senhora Caterini, posso assegurar que jamais foi cometido algum tipo de irregularidade, não sendo verdadeira a afirmativa da mesma.
Enfim, com relação ao chanceler Pierpaolo Savio, desejo evidenciar que se trata de uma das pessoas envolvidas na investigação acima mencionada relativa à concessão de vistos a cidadãos peruanos. Como foi noticiado pela imprensa italiana, o referido chanceler sofreu uma detenção cautelar de alguns dias por determinação da magistratura italiana."


(© Folha de S. Paulo)

 

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