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"Dias de Abandono" fala de separação e superação pessoal

Margherita Buy em "Dias de Abandono"


Margherita Buy, a Olga do filme do italiano Roberto Faenza, ganhou o prêmio de melhor atriz no Festival de Veneza de 2005

Luiz Zanin Oricchio

SÃO PAULO - Margherita Buy é a alma dilacerada de "Dias de Abandono", do italiano Roberto Faenza. Ela é Olga, que vê sua vida desabar quando o marido confessa um caso com uma mulher muito mais jovem e deixa a casa. Pela sua atuação, Margherita ganhou o prêmio de melhor atriz no Festival de Veneza de 2005. Mais do que merecido. Aliás, "La Buy", como os italianos costumam chamar suas divas, é o que o filme tem de melhor. Sua alma e corpo, por assim dizer.

Espantou que Margherita, com seu ar nórdico e distante, encarnasse com tanta convicção a mulher meridional que se entrega às suas paixões com intensidade - a ponto de quase sucumbir a elas. Estereótipos, como se os povos do Norte não estivessem sujeitos aos mesmos estados de alma do resto da humanidade. Bastaria ver os filmes de Bergman, fotografados pelo magnífico Sven Nykvist. Mas, enfim, clichês existem e grandes atores e atrizes estão aí para desmenti-los. E talvez seja exatamente o que mais nos sensibiliza no drama de Olga - ela ser uma mulher tão centrada que parece imune ao sofrimento. Para depois constatarmos que o sofrimento é uma moeda comum a todos nós - loiros ou morenos, desta ou daquela latitude. E por isso uma grande atriz pode nos levar àquela relação de simpatia que estabelecemos com determinado personagem.

Roberto Faenza é um diretor interessante e sabe conduzir seu drama com sensibilidade. Talvez o público brasileiro lembre de "Páginas da Revolução", com Marcello Mastroianni no papel de um velho editor português no tempo da ditadura de Salazar. Tinha lá seu encanto, embora portugueses falando italiano em nada contribuam para a credibilidade de um filme. Mas havia Marcello - Faenza sempre soube escolher seus atores.

O drama de Olga não é menor do que o de Pereira, personagem de Mastroianni em "Páginas da Revolução". Num caso, político em outro, pessoal, trata-se sempre de dar sentido à própria vida quando as certezas desabam. Para uma mulher de meia-idade, que antevê uma velhice tranqüila, doce declínio ao lado de alguém tão familiar, a separação pode ser um choque. Tão grande como aquele de alguém habituado há tanto tempo a um regime opressivo que nem mais se dá conta dele, até o dia em que surgem alguns jovens que o obrigam a tomar uma posição. E mudar de vida.

Mudar a vida - eis aí um tema comum. No caso de Margherita, tanto como no de Pereira, mudanças obrigatórias, não desejadas. Compulsórias, mas que poderão trazer outro significado a existências já enrijecidas pela rotina, pela repetição, pelos dias cinzentos. A estes dias cinzentos, se substituem os dias de abandono, na tradução literal do italiano "I Giorni dell’Abbandono", tirado de um romance de Elena Ferrante.

O problema de Olga será o de, primeiro, não enlouquecer. Segundo, crescer como pessoa em meio à crise. Apesar do tom às vezes novelesco, diga-se em favor de Faenza que em nenhum momento propõe soluções mágicas, baboseira típica do cinema comercial. Sabe que crescer significa passar pelo inferno. É o que La Buy transmite ao espectador.

Dias de Abandono (I Giorni Dell’Abandono, Itália/2005, 112 min ) - Drama. Dir. Roberto Faenza. 14 anos. Reserva Cultural 3 - 13h10, 15h10, 17h10, 19h10, 21h10. Unibanco Arteplex 8 - 15h10, 17h20, 19h30, 21h40 (sáb. também 0 h). Cotação: Regular

(© Agência Estado)


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