O Tigre e a Neve
lembra sua melhor atuação, em A Voz da Lua,
de Fellini
Luiz Zanin Oricchio
SÃO PAULO - No começo de O Tigre e a Neve,
lembramos um pouco a atmosfera do melhor filme em que
Roberto Benigni participou como ator - A Voz da Lua,
de Federico Fellini. A atmosfera é onírica, como na obra
do “maestro”, com um Benigni em roupa de dormir chegando
ao lugar bucólico onde um casamento está sendo
celebrado. Tom Waits (o próprio) toca piano e
acompanha-se em You Can Never Hold Back Spring,
que ele compôs com Kathleen Brennan.
Sonhos, mas na “vida
real” da história, Benigni, no papel de Attilio, é
também um sonhador. Poeta, é dele o livro que dá título
ao filme, O Tigre e a Neve. E seu sonho é
casar-se com a mulher de sua vida, Vittoria (Nicoletta
Braschi), que evita como pode esse clown das letras.
Vittoria também é ligada ao mundo da literatura e está
terminando a tradução do poeta iraquiano Fuad, vivido
pelo francês Jean Reno. É a possibilidade de fazer uma
série de entrevistas com o poeta que levará Vittoria a
Bagdá, no início da guerra que os Estados Unidos,
apoiados por seus aliados Blair e Berlusconi, moverão
contra Saddam Hussein.
Tom
chapliniano
Benigni é o que
conhecemos de outros filmes - a presença exuberante em
cena, o tom chapliniano de um humor tanto físico quanto,
no seu caso, verbal. Aliás, verborrágico, como dizem
seus detratores, e eles não são poucos. Ainda mais
quando Benigni encarna um personagem à sua medida, um
poeta lunático, como o senso comum supõe que os poetas
sejam, distanciados da realidade, distraídos, falando
pelos cotovelos, de senso prático nulo.
De certa maneira, o
personagem de Attilio passa por esses estereótipos. Mas
como negar o encanto da seqüência em que ele explica aos
alunos de onde provém a magia das palavras? Aqui
encontramos o melhor Benigni, aquele que encanta seu
país recitando Dante Alighieri em concorridas turnês.
Ele tem mesmo essa relação privilegiada com o idioma,
essa faculdade de tomar as palavras como seres em si,
senti-las, medir seu peso, extensão e profundidade.
Infelizmente, Benigni,
tão sensível e inteligente com as palavras, nem sempre
tem o senso de medida necessário com o trabalho
cinematográfico. Daí a sensação de excesso que seus
filmes, em geral, passam. Se ele encontra a medida justa
em A Vida É Bela, que não por acaso fez sucesso e ganhou
tantos prêmios, em outros trabalhos costuma usar sua
vocação sempre para mais e nunca para o menos. O Tigre e
a Neve não é exceção.
Da mesma forma, se a
primeira parte da história (o sonho, o relacionamento
difícil e idealizado com Vittoria, a presença das
filhas, etc.) parece bem agenciada, a segunda, que se
passa no Iraque, não anda tão bem. Seria exagero dizer
que desaba, mas Benigni apresenta muito mais facilidade
em trabalhar no registro do cômico que do dramático.
Mesmo assim, essa virada de perspectiva não deixa de ter
interesse. O poético em Benigni causaria melhor
impressão se não fosse tão verborrágico. Mas então não
seria Benigni.
O Tigre e a Neve
(113 min) - 10 anos. Cine Bombril 1 - 14 h, 16h30, 19 h,
21h30. Kinoplex 4 - 13h50, 16h10, 18h40, 21h10 (6ª. e
sáb. também 23h30). Morumbi Cine TAM 4 - 14h10, 16h40,
19h10, 21h40 (sáb. também 23h50). Sala UOL - 14 h,
16h30, 19 h, 21h30. Unibanco Arteplex 6 - 13h50, 16h20,
18h50, 21h10 (sáb. também 23h40; 2.ª não haverá 21h10).
Cotação: Regular