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Piranesi, atual depois de três séculos

27/01/2008

Templo de Saturno e Arco de Septímio Severo. João Baptista Piranesi(1720-1778)
 

Piranesi, que revolucionou a arquitetura e o design do seu tempo, ganha mostra em Nova York

Maria Ignez Barbosa

Um Piranesi radical e surpreendente, arquiteto e designer de móveis e interiores, é o que nos revela uma bela exposição no Museu Cooper- Hewitt em Nova York, organizada em associação com o Rijksmuseum, da Holanda.

Artista conhecido por suas lindas vistas da Roma antiga e pela famosa série de gravuras Os Encarcerados ou Prisões Imaginárias, o veneziano Giovanni Battista Piranesi, um dos mais famosos gravadores do século 18, nascido em 1720 e morto em 1778, foi treinado na arquitetura apesar de a profissão ainda não existir oficialmente. Embora tenha revolucionado a arquitetura com propostas inovadoras mais do que propriamente com edificações - e produzido móveis excêntricos ao introduzir e combinar elementos decorativos e motivos ornamentais inspirados nos mais variados estilos como o egípcio, o etrusco, o grego e o romano -, nas últimas décadas seu nome como arquiteto vinha sendo injustamente associado ao recente pós-modernismo, obcecado por motivos clássicos e já tão cansativo.

Libertá-lo desse clichê é o que consegue esta exposição. Por meio de mais de 100 gravuras, desenhos originais e objetos decorativos, Piranesi, As Designer analisa os conceitos modernistas do arquiteto, mostra o impacto que causou em seus contemporâneos (como Robert Adam, François-Joseph Bélanger e Etienne-Louis Boullée), demonstra como sua influência ainda se faz sentir sobre designers contemporâneos (como Michael Graves, Peter Eisenman, Daniel Libeskind e Robert Venturi) e nos revela o artista radical, que na verdade foi conceitual e recusou-se a se dobrar às convenções de seu tempo. Sua liberdade de imaginação e sua disposição em contestar idéias preconcebidas tem tudo a ver com a preocupação dos designers contemporâneos.

Piranesi, que cresceu e estudou em Veneza, era filho de operário e seu sonho, construir cidades. Em Roma, descobriu e apaixonou-se pelas famosas ruínas antigas que passaram a ser um constante e obsessivo tema de suas gravuras. Ali viveu, conheceu a pobreza e terminou seus dias já afamado como um dos maiores gravadores da época. Dispostos na primeira e segunda galerias estão os estudos topográficos da Roma antiga, fan-tasias arquiteturais, investigações arqueológicas e desenhos para projetos a ele encomendados e que lhe permitiram dar vazão a novos modos de expressão. Ao nos possibilitar a observação do desenho preliminar ao lado da peça impecavelmente terminada, a mostra deixa claros não só os conceitos, mas como se desenrolava o processo criativo de Piranesi.

Mesa de 5 pés

Já a galeria central reúne uma grande quantidade de móveis e objetos feitos para interiores, como chaminés, pedimentos, cômodas, mesas, cadeiras, candelabros, espelhos, apliques, vasos, urnas e bules para chá e café e que surpreendem pela beleza e pelos detalhes da ornamentação. Instiga o fato de uma mesa com tampo de mármore se sustentar sobre cinco, e não quatro, pés dourados com cabeças de leão. Seria apenas um recurso para adicionar mais ornamento? Para Piranesi, ao que se pode deduzir e concluir, menos nunca foi mais, muito pelo contrário. Além de fértil pensador, era um inquieto e sua devoção à antiguidade clássica fez com que se visse no meio de um dos mais acirrados debates de seu tempo - aquele entre acadêmicos e arquitetos franceses, que desejavam a volta aos modelos gregos, e os nacionalistas italianos, onde ele se incluía, e que defendiam a superioridade da arquitetura romana.

Fincada nos ideais do Iluminismo, tratava-se menos de uma questão de estilo decorativo do que de ideal histórico e cultural. Seu mérito foi perceber o engodo dessas idealizações. Dizia que, em matéria de arquitetura, não havia um Éden ao qual retornar. Acreditava que somos livres para interpretar a história do nosso próprio jeito. E nessa linha de propor a liberação de impulsos criativos, e ao preparar, em 1749, os desenhos para as séries Prisões Imaginárias, desenhou escadas que levam a lugar nenhum, pontes soltas no espaço, paredes que não se fincam no solo e um labirinto de celas sob arcos, evocando fantasias mentais assustadoras. O contraste entre luzes e sombras, sempre presente em seus desenhos, também contribui para o retrato dessa alienação muito moderna. Nada do ali proposto poderia existir no mundo real, mas, numa atual leitura de seus desenhos, podemos perceber que serviram a um argumento filosófico bem mais amplo: o de questionar as inflexíveis hierarquias sociais e formalistas adotadas pela maioria dos arquitetos à época.

Em seu mundo próprio, o irracional e o arbitrário triunfam sobre a ordem racional e assim sua arquitetura serve mais para expor as contradições do mundo do que propriamente para apresentar soluções. Até o inglês John Soane, famoso e também radical arquiteto neoclássico, apesar de advertir colegas e alunos em relação aos excessos de Piranesi, se deixou por ele influenciar. Um exemplo é o projeto tão sério e sombrio que fez em 1800 para o Banco da Inglaterra.

Esboços e gravuras

Um dos pontos altos da exposição é um grupo de esboços e gravuras com projetos de arquitetura e de objetos decorativos, que pertencem à coleção permanente do próprio museu, e às bibliotecas Morgan e Avery de Arquitetura da Universidade de Columbia, mostrados pela primeira vez ao lado de objetos correspondentes produzidos para a exposição com base nesses desenhos e em 3D.

Na última galeria, fica demonstrado como a prática e a teoria incrivelmente modernistas de Piranesi continuam fazendo sentido tantos séculos depois. A suíte Prisões Imaginárias, que obriga o olhar do visitante a viajar através de ambigüidades espaciais e paradoxos visuais, é apresentada em justaposição a desenhos de arquitetos contemporâneos que utilizam elementos visuais complexos e similares para também estimular o interesse e a imaginação de quem olha. Entre esses trabalhos, o Estádio, de Peter Eisenman, no Arizona, e a série Micromega, de Daniel Libeskind.

Também ali, criando novos paralelos e exemplificando o pioneirismo de Piranesi em misturar elementos e estilos arquitetônicos, muitos desenhos de arquitetos contemporâneos que igualmente tomam emprestado a ornamentação de diversas fontes.

O belo catálogo de 200 páginas, com textos de arquitetos e especialistas em Piranesi, já é objeto de desejo e leitura imprescindível para jovens arquitetos e designers. A exposição viaja em fevereiro para o Teylers Museum, em Haarlem, na Holanda, onde continuará a mostrar que se livrar de ortodoxias é fundamental para o avanço da estética e que um legado de fantasias mentais pode ter mais alcance e duração do que monumentos concretos.

Saiba+ sobre Piranesi

(© Estadão)


Arquitetura do futuro

O impacto de projetos assinados por arquitetos como Frank O. Gehry e Rem Koolhaas provoca um tsunami editorial, começando com um livro do italiano Leonardo Benevolo, lançado agora

Antonio Gonçalves Filho

Numa época em que a arquitetura ganha status de espetáculo com os projetos faraônicos de Frank O. Gehry e Daniel Libeskind, pensar no impacto ecológico que essas novas estruturas provocam no meio urbano é tarefa para profissionais. Um deles é o respeitado crítico e historiador italiano Leonardo Benevolo, de quem a editora Estação Liberdade acaba de lançar A Arquitetura no Novo Milênio (tradução de Letícia Martins de Andrade, 496 págs., R$ 86). Entrevistado pelo Estado, Benevolo mostra-se preocupado com as experiências arquitetônicas emergentes no mundo e os modelos de urbanização abusivos que ameaçam o futuro das metrópoles. O estudioso italiano, obviamente, não é o único. Centenas de estudantes e profissionais de arquitetura dividem com Benevolo as mesmas inquietações, despertando o interesse das editoras brasileiras por ensaios e livros teóricos de arquitetura. Nunca o mercado editorial brasileiro viu surgirem tantas obras sobre o assunto.

É certo que editoras como a Perspectiva, detentora de outros títulos fundamentais de Benevolo (A Cidade e o Arquiteto, entre eles), publicam livros de arquitetura já há algum tempo, mas o fenômeno das coleções inteiras dedicadas ao tema é recente. Existiam, ao lado de estudos teóricos sérios como os da Perspectiva, Martins Fontes e Cosac Naify - para citar apenas três editoras -, publicações esparsas com muitas imagens e pouca reflexão, mas agora a aposta vai em outra direção. É o caso da Estação Liberdade, que lança em breve uma coleção escrita por arquitetos refletindo sobre a própria obra. Serão seis livros só este ano, de um estudo assinado pelo português Álvaro Siza, Imaginar a Evidência, ao desafiador A Ética de Construir, do italiano Mario Botta, passando por obras clássicas de Lissitzky e Le Corbusier ou de contemporâneos brasileiros - Oscar Niemeyer e Paulo Mendes da Rocha, entre eles.

Títulos estrangeiros já começam a ser disputados nas feiras internacionais. Em contrapartida, brasileiros já são vendidos para editoras estrangeiras. No primeiro caso está o cobiçado Nova York Delirante, do holandês Rem Koolhaas, hoje um dos mais conceituados inovadores da arquitetura européia, que só perde em citações para Norman Foster no livro de Benevolo. Na última feira de Frankfurt, editores brasileiros brigaram para ter o título. Venceu a Cosac Naify, que conseguiu trazer Koolhaas para sua coleção Face Norte. Ela vai publicar ainda este ano textos selecionados de Lina Bo Bardi e Flávio Motta. A mesma editora vendeu para a italiana Rizzolli os dois livros que publicou sobre o arquiteto paulistano Paulo Mendes da Rocha, ganhador há dois anos do prêmio Pritzker.

A procura por títulos brasileiros tem feito com que as editoras produzam edições bilíngües, como as de Mendes da Rocha ou as da coleção Portfolio, lançada pela J.J. Carol, que já tem 25 volumes. Cinco novos serão lançados este ano, entre eles um dedicado ao arquiteto Ruy Ohtake, que assina um texto nesta edição sobre os novos rumos da arquitetura. Monografias sobre o trabalho de arquitetos brasileiros não eram comuns até a década passada, quando as editoras passaram a destacar o trabalho individual desses profissionais. Hoje, várias editoras e institutos publicam livros dedicados a eles, entre os quais o mais disputado é, claro, Niemeyer. O Instituto Tomie Ohtake coloca esta semana no mercado o luxuoso volume Niemeyer - 100 Anos, 100 Obras. A Cosac Naify, que já publicou o estudo de David Underwood (Oscar Niemeyer e o Modernismo de Formas Livres no Brasil), lança ainda este ano um volume (Oscar Niemeyer - Fortuna Crítica) organizado por Carlos Alberto Ferreira Martins. Ele traz tudo o que foi escrito sobre Niemeyer no Brasil e exterior, dos anos 1930 até hoje.

Os resultados dessa investida do mercado editorial são animadores. Alguns títulos da Martins Fontes, como História Crítica da Arquitetura Moderna, de Kenneth Frampton, já vendeu mais de 15 mil exemplares. Com o mercado abastecido de estudos clássicos, as editoras partem agora para os livros que analisam o futuro da arquitetura, como os de Leonardo Benevolo. Chega ainda este ano às livrarias o estudo do espanhol Rafael Moneo, Inquietude Teórica e Estratégia Projetual na Obra de Oito Arquitetos Contemporâneos. O livro analisa a arquitetura de herdeiros da tradição moderna (Álvaro Siza), “inovadores” (Norman Foster) e “impacientes” (Frank Gehry), para seguir a divisão de Benevolo.

(© Estadão)

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