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A trajetória de Guido Viaro, o italiano que aguardava chamados impossíveis

O visionário Guido Viaro desiludiu-se com a política e resolveu vir para o Brasil, onde rompeu os laços com a pintura acadêmica
 

A crítica de arte e pesquisadora Maria José Justino lança nesta terça-feira (20), às 19h, no Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, o livro “Guido Viaro, um visionário da arte”. Título que também dá nome à exposição em cartaz no Museu até o próximo dia 08. Na mesma ocasião, também será lançado o DVD Rom –“Revelando Viaro”, de Juliano Sandrini, com mais de mil reproduções da obra artística do italiano Guido Viaro (1897-1971), além de textos críticos. Durante o lançamento será apresentado o vídeo “Guido Viaro, um retrato coletivo”, produzido pelo neto do artista, Túlio Viaro.

A exposição, o livro, o DVD e o vídeo integram um grande projeto de resgate da obra de Guido Viaro, desenvolvido sob a curadoria do filho do artista, Constantino Viaro, em parceria com Estela Sandrini e Maria José Justino. O Museu Oscar Niemeyer foi parceiro na produção da exposição e do livro. Os produtos em lançamento serão comercializados, individualmente (item a item), na loja do Museu e ainda não há preços definidos.

Em capa dura (21x30cm), com 220 páginas, o livro sobre a vida e a obra de Viaro apresenta textos críticos e referências bibliográficas de toda a produção crítica sobre o artista. A publicação possui mais de 300 ilustrações coloridas de pinturas, aquarelas, gravuras, desenhos e esculturas. O livro contou com a colaboração dos pesquisadores Vera Batista Biscaia e Irai Casagrande.

Todo esse trabalho de resgate teve início com a exibição da exposição “Guido Viaro – Um visionário da arte”, que apresenta a maior retrospectiva da produção de Viaro, que se radicou em Curitiba a partir de 1929. Composta de aproximadamente 200 obras, incluindo pinturas, desenhos, gravuras e esculturas, a mostra foi aberta ao público em 29 de novembro e foi prorrogada até o próximo dia 08 de abril. “O Medo”, “O Homem sem Rumo” e “Polaca” são algumas das obras-primas presentes na exposição. A maior parte das obras pertencem à família do artista e apenas 30 delas a colecionadores particulares e instituições de arte.

Serviço

Lançamento:
“Guido Viaro, um visionário da arte” (livro)
“Revelando Viaro” (DVD Rom)
“Guido Viaro, um retrato coletivo” (vídeo)
Quando: terça-feira (20), às 19h
Onde: Hall do Pátio das Esculturas, no Museu Oscar Niemeyer
Endereço: Rua Marechal Hermes, 999
Centro Cívico – CEP: 80530-230
Telefone: (41) 3350-4400
Horário: de terça a domingo, das 10h às 18h
Preços: R$ 4,00 adultos e R$ 2,00 estudantes identificados
(Não pagam crianças de até 12 anos, maiores de 60 e grupos de estudantes agendados de escolas públicas, do ensino médio e fundamental)

Veneto

Em 2007, transcorrerá o 110o aniversário do nascimento de Guido Pellegrino Viaro, em Badia Polesine, Sargo, Veneto. O filho dos agricultores João Batista Viaro e Santina Solda Viaro transformou-se no artista moderno mais importante do Paraná e um dos mais representativos do Brasil.

Na verdade, Viaro, desenhista, gravurista, escultor e um eterno pesquisador, foi quem introduziu a pintura moderna no Estado onde não tinha a intenção de ficar, mas foi traído pela paixão. Conheceu Yolanda e a passagem comprada para ir ao México foi vendida e transformada em flores para sua amada, como destaca matéria sobre a vida do artista publicada pela secretaria de Estado da Cultura do Paraná*.


 
Viaro percebeu, muito cedo, que os horizontes do mundo eram muito mais amplos que o cinturão verde que circundava sua cidade natal, no Veneto. Foto: Acervo da Família

Viaro conseguiu romper os laços com a pintura acadêmica, apresentando uma nova proposta artística numa cidade que se ressentia de maiores informações sobre os novos movimentos artísticos mundiais.

A Semana de Arte Moderna de 1922 foi praticamente ignorada pelos curitibanos. Foi Viaro quem quebrou lanças para mostrar os novos caminhos da arte. Lutou de todas as formas, criando discípulos que hoje são pintores importantes, tais como Fernando Velloso, Fernando Calderari, Juarez Machado, Domicio Pedroso, Ida Hanemann Campos, Luiz Carlos Andrade Lima, João Osório Brezezinski, Euro Brandão e tantos outros que passaram pela sua escola e foram contagiados pelo seu entusiasmo.

Em 1937, fez as primeiras experiências com crianças, iniciando a primeira escolinha de arte do país, que mais tarde se transformou no Centro Juvenil de Artes Plásticas. Sua intenção não era fazer artistas , mas sim desenvolver uma nova mentalidade artística através da arte na educação. Era catequizar as crianças e proporcionar-lhes um conhecimento artístico que talvez seus pais não tiveram.

Já  na pequena Badia Polesine, sempre soube claramente o que queria. Sua vontade era ser pintor, e nenhum obstáculo seria suficientemente forte para impedir que ele realizasse esse desejo. Lutou contra a vontade da família - que o queria médico - contra as dificuldades financeiras, contra a pobre cultura camponesa - que o abafava - e com todas as dificuldades que um rapaz pobre tem para seguir uma carreira artística. Percebeu, muito cedo, que os horizontes do mundo eram muito mais amplos que o cinturão verde que circundava sua cidade natal.

Seu tio Angelo Viaro, escultor de grande nome em Bolonha, vendo suas pinturas, percebeu cedo seu talento e mandou um de seus trabalhos a um Salão de Veneza, que lhe deu uma menção honrosa, quando tinha 15 anos de idade.

Abafado pela tranqüilidade da aldeia, foi a Veneza, onde apaixonou-se pela cidade e pelo modo sensível com o qual os venezianos respeitavam as artes e os artistas. Em seguida foi a Florença, Milão e Roma, para completar o volume de informações que necessitava para formar sua cultura artística.

A ampliação de seu horizonte era Paris. Sua primeira viagem foi de carona com um corredor de automóveis. Sofreu, passou fome, trabalhou, mas conseguiu sobreviver. Conheceu artistas, movimentos artísticos, viveu momentos muito importantes de sua vida. Voltando à Itália, desiludido com os movimentos políticos, cujas ações efervescentes minavam a juventude da época com autoritarismo, prepotência e violência, resolveu reunir algumas liras e comprar uma passagem para o Brasil.

Chegando ao Rio, já sentiu a despreocupação do povo com as definições ideológicas rígidas que o caldeirão político italiano impingia obsessivamente a seus jovens.

Em São Paulo, sentiu-se bem, começando a segunda parte de sua trajetória artística. Trabalhou como desenhista de jornais, mas já em 1927 fez sua primeira exposição individual. Foi muito bem recebido em São Paulo, por intelectuais, pintores e críticos. Vendeu quadros e teve a encomenda de alguns murais, muito em moda na época, em cafés e em algumas mansões da Av. Paulista e Jardins.


 
Em Curitiba, Viaro conheceu Yolanda, a grande mola propulsora de sua inspiração. Foto: Divulgação

Esteve em algumas cidades do interior de São Paulo, vindo a seguir a Curitiba. Sua intenção não era ficar no Brasil, e sim conhecer o país, vivendo de sua arte.

Curitiba, que em sua intenção inicial era apenas mais um local onde permaneceria por algum tempo, talvez tenha lhe proporcionado a surpresa mais inesperada de sua vida. Conheceu Yolanda e apaixonou-se loucamente por ela.  Foi o casamento que fixou Viaro, consolidou seu trabalho de artista e mestre na cidade que o acolhera. Mas ele também fez o possível para retribuir, transmitindo o que sabia de seu ofício a seus semelhantes.

Se conhecer Yolanda foi a grande mola propulsora de sua inspiração artística, sua morte, em 1970, causou um dano irreversível a seus sentimentos. A vontade de viver acabou. Foi se consumindo a cada dia, sem doença, mas também sem vontade de viver. Sua morte parecia ter encerrado sua passagem feliz pela terra, passagem que somente poderia ser vivida a dois.

Em seus escritos, Viaro diz: “Sempre sonhei de olhos abertos com viagens e terras distantes, aguardando chamados impossíveis”.

*Bibliografia

Guido Viaro artista e mestre. Curitiba, Departamento de Cultura da Secretaria de Estado de Educação e Cultura do Estado do Paraná, 1967.
FUNARTE, Guido Viaro, Brasília: Fundação Nacional de Arte, 1977.BRANDÃO, Euro. Guido Viaro: a valorização da figura humana, Curitiba : Museu Guido Viaro, 1981.

(© Oriundi)

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