FLORENÇA -
Depois de passar 32 anos no rastro da obra-prima perdida de Leonardo
Da Vinci A Batalha de Anghiari, Maurizio Seracini acredita
que está prestes a solucionar um dos maiores mistérios do mundo da
arte.
O engenheiro e especialista em
arte italiano acredita saber onde pode estar escondido o afresco que
desapareceu há quase cinco séculos: atrás de uma parede, bem no
lugar onde foi pintado, na sede renascentista da Câmara Municipal de
Florença.
Se ele tiver razão, é impossível
superestimar a importância que tal descoberta teria.
"Na época de Leonardo, seus
contemporâneos consideravam o afresco não apenas sua melhor obra de
arte, mas ´a´ melhor obra de arte de todas, a obra-prima suprema",
disse Seracini em seu escritório próximo ao Palazzo Vecchio, onde
ele acredita que a pintura se encontre escondida.
"Estamos procurando a mais
importante obra-prima da Renascença, o ponto mais alto já atingido e
a mais importante obra-prima de Leonardo Da Vinci", disse ele à
Reuters.
"Coisa milagrosa"
Os governantes de Florença
encomendaram de Leonardo, então no auge de sua carreira, um afresco
que celebrasse a vitória da República Florentina sobre os milaneses
na planície de Anghiari, que aconteceu em 29 de junho de 1440.
Leonardo, que considerava a guerra
"a loucura mais bestial", começou em 1505 a trabalhar sobre o imenso
mural, que se acredita ser três vezes maior que A Última Ceia.
Seu tema central era um grupo de cavalos e cavaleiros lutando
furiosamente por um estandarte.
Um ano mais tarde, porém,
possivelmente decepcionado com uma técnica experimental que usara no
afresco e que alguns peritos acham que o teria danificado, ele
abandonou a pintura e partiu para Milão.
A obra, que um cronista da época
descreveu como "coisa milagrosa", é conhecida hoje através dos
esboços preliminares feitos por Leonardo de guerreiros a cavalo,
além de cópias feitas por outros artistas.
Mas todos os resquícios do
original se perderam quando o artista e arquiteto do século 16
Giorgio Vasari reformou o Salão dos 500, no Palazzo Vecchio, onde
estava o afresco.
Durante muito tempo, acreditou-se
que a pintura tivesse sido destruída e substituída pelos afrescos de
batalhas militares pintados pelo próprio Vasari. Até a chegada de
Seracini.
TecnologiaEngenheiro biomédico formado nos
EUA e apaixonado pela conservação de obras de arte, Seracini começou
a procurar o afresco, conhecido como O Leonardo Perdido, em
1975.
Em 1977, Seracini foi obrigado a
abandonar o projeto. A tecnologia existente na época não era
suficientemente adiantada para que se pudesse explorar mais sem
prejudicar o afresco de Vasari.
Mas a busca foi retomada em 1999,
graças ao financiamento fornecido pelo milionário anglo-irlandês
Loel Guinness.
Usando tecnologias médicas e
militares como termografias, Raios-X e radares, Seracini encontrou
outra possível pista: uma pequena cavidade debaixo do mural de
Vasari que o levou a crer que Vasari não teria destruído a parede
sobre a qual Leonardo pintou, mas erguido outra parede diante dela.
"Vasari era grande admirador de
Leonardo. Ele não tinha razões para destruir, danificar ou remover a
pintura de Leonardo. E ele empregou uma tática semelhante para
esconder a ´Santíssima Trindade´ de Masaccio. Então talvez tenha
salvado o afresco", disse Seracini.
Em 2003, Seracini -- que até então
já chamara a atenção mundial ao descobrir que ´A Adoração dos Reis
Magos´, de Da Vinci, tinha sido pintada por cima por outros artistas
-- topou com outro obstáculo.
Afirmando que as evidências eram
pouco convincentes, a Câmara Municipal de Florença não renovou sua
licença para levar a busca adiante. Este mês, porém, o governo
decidiu dar o sinal verde para que a busca prossiga.
Seracini diz que precisa de dez
meses para desenvolver um aparelho capaz de captar radiações dos
elementos químicos contidos nos pigmentos empregados por Leonardo no
afresco, como o chumbo para produzir a cor branca, o cobre para o
azul e o mercúrio para o vermelho. Depois disso, poderá solucionar o
mistério.
"É hora de ir lá e ver se restou
alguma coisa", disse ele. Mas, afirmou que, se não houver nada, ele
não sentirá que perdeu seu tempo. "Espero ter comprovado que podemos
empregar métodos científicos para compreender as obras de arte e
preservar nosso patrimônio cultural."