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Migrazioni ItaliaOggi

 

Pesquisa de Doutorado do Prof. Marcos Saquet: A Colônia Silveira Martins

 

 

O Italiaoggi, com o objetivo de divulgar e agregar conhecimentos sobre a importante contribuição de outros grupos étnicos em nosso país, especialmente o italiano, entrevista com prazer o professor Marcos Aurelio Saquet que, com certeza, trará com seu trabalho mais esclarecimentos sobre o evento da imigração italiana no Brasil.

Professor, o sr. poderia nos dizer por que escolheu trabalhar com imigrantes italianos? Qual o enfoque de sua pesquisa? Por que a escolha desta colônia no Rio Grande do Sul?

Escolhi os processos de imigração e colonização italiana para estudos, porque, em primeiro lugar, sou descendente de italianos (nasci em um dos municípios que se formaram a partir desta colônia) e em segundo, porque a Colônia Silveira Martins carece de pesquisas sobre sua gênese e seu desenvolvimento econômico, bem como, de seus produtos geográficos. É por isso que destaco em minha investigação o ritmo de desenvolvimento econômico, os fatores que condicionaram este desenvolvimento e suas características territoriais entre 1878 e 1950. A Colônia Silveira Martins foi construída a partir de 1878 no Rio Grande do Sul, por iniciativa do Governo Imperial, para alojar parte dos colonos italianos que chegavam no país naquele período. Sua criação deu-se "dentro" do processo de expansão do capitalismo no Brasil, e simultaneamente, da formação do território gaúcho.

Pretendo com isso, contribuir para o entendimento do que aconteceu naquele lugar; para o conhecimento do desenvolvimento regional. Parece-nos fundamental conhecer o processo de formação da referida colônia, para projetar o futuro com um mínimo de qualidade de vida, o que é, também, tarefa dos geógrafos. Ou seja, é preciso compreender a dinâmica socioespacial; a apropriação e produção do espaço local. Penso que, cada vez mais, aumenta a necessidade de se ter dados e informações ligados aos "problemas regionais", ou às particularidades, dentro do processo de formação do espaço "nacional". E que estes dados e informações, e possíveis interpretações, possam ser usadas na gestão do território, ou dos territórios, participativamente.

O sr. tem tido contato com os moradores da região pesquisada? Qual é a receptividade deles? E em relação ao meio acadêmico, há muitos estudos nesta linha?

Sim. Estou fazendo trabalho de campo bimestralmente. Coleto dados em arquivos públicos, prefeituras, cartórios etc e procuro circular e conversar com os moradores locais, principalmente aqueles de idade mais avançada. Diga-se de passagem, esta é uma atividade muito gostosa, pois as pessoas se sentem felizes em relembrar fatos ou eventos do passado, como viviam, as dificuldades nas atividades produtivas, as escolas, entre outros. A maioria enaltece seu trabalho, desconhecendo a subordinação e a exploração inerentes às suas atividades produtivas diárias.

Academicamente, os estudos sobre a colonização italiana no Rio Grande do Sul são vários, principalmente sobre Caxias do Sul, Bento Gonçalves e Garibaldi. Uns destacando os aspectos mais econômicos, outros, os culturais, no entanto, acredito que é preciso ir além disso, porque a dinâmica socioespacial é substantivada por estas dimensões articuladas entre si, e mais, articuladas com a dimensão (geo)política. Penso que é imprudente separar estas dimensões, porque corremos o risco de não apreender coerentemente os fenômenos de cada tempo e lugar. Por isso, estamos tentando trabalhar a territorialização em Silveira Martins sob este tripé e contextualizando-a na formação do território no Rio Grande do Sul.

Quais as principais dificuldades de sua pesquisa?

Num primeiro momento, a preocupação com as dificuldades para coletar os dados que precisava, e principalmente, sobre o método de interpretação. Mas, à medida que as atividades foram sendo desenvolvidas, notei que seria possível encontrar os dados necessários, relativamente antigos e que, com cautela e muita reflexão, poderia, lentamente, trabalhar a partir dos pressupostos teóricos do materialismo dialético. Agora, as preocupações centram-se neste último aspecto, porque a complexidade dos processos sociais exige do pesquisador muita astúcia e atenção, além de uma certa experiência relativa à metodologia científica. É preciso evitar as generalizações falsas, porque acabam depreciando consideravelmente a abordagem e enganando o próprio pesquisador.

Sabemos que o sr. esteve na Itália recentemente. Como foi sua estada lá? O sr. poderia fazer um paralelo sobre os estudos que são feitos no Brasil e os que se fazem na Itália sobre a emigração italiana?

Tive a oportunidade, na Província de Marche, de estudar um pouco da cultura, da História, da língua e da Geografia italiana, o que contribuiu significativamente para compreender melhor a desterritorialização (emigração) italiana para o Brasil, especialmente para o Rio Grande do Sul. Visitei algumas universidades onde tenho contatos com alguns professores e também adquiri algumas obras sobre a história italiana. Se tudo transcorrer normalmente, devo retornar para lá, agora ao Veneto, no próximo ano, para dar continuidade às minhas pesquisas.

Agora, uma questão que me chamou atenção, foi justamente sobre os estudos de autores italianos sobre a emigração para outros países, especialmente para o Brasil, porque verifiquei, grosso modo, que a preocupação com este processo não é substancial. O próprio descaso inicial do governo italiano com a emigração provocou uma certa escassez de registros. Alguns autores italianos se destacam, mais recentes, mas acredito que a saída de italianos para o Brasil merece maior atenção por parte de pesquisadores italianos e mesmo de estudiosos brasileiros, pois constatamos, até o momento, que os condicionantes da desterritorialização italiana são tratados muito superficialmente. Está aí, então, uma boa problemática para estudos, sobre o que, pretendemos dar nossa contribuição com o desenrolar de nossas pesquisas.

O sr. poderia nos adiantar alguma informação sobre sua pesquisa?

Sem dúvidas. A gênese da Colônia Silveira Martins acontece sob interesses geopolíticos e econômicos, tanto no nível regional como nacional. Ao nível de país, sucintamente, tinha-se necessidade de produzir alimentos para o mercado interno e no Rio Grande do Sul, precisava-se povoar terras ainda desocupadas efetivamente e diversificar a economia local. Por isso, como já mencionei, grosso modo, porque não cabe aqui uma descrição mais profunda e detalhada, o governo imperial cria uma colônia agrícola nas proximidades de Santa Maria, que foi logo denominada de Silveira Martins.

Esta colônia, cujas terras inicialmente estavam localizadas nos municípios de Santa Maria e Cachoeira do Sul, tem um incremento importante na sua população e produções agrícola, comercial e artesanal. Comparando os dados referentes às produções artesanais da sede da Colônia Silveira Martins entre 1884 e 1925, por exemplo, verifiquei que, em termos gerais, o desenvolvimento "industrial" e/ou artesanal desta, teve um crescimento positivo entre 1884 e 1914, mas diminui entre 1914 e 1925. Ou seja, o número de atividades artesanais passa de 34 em 1884, para 54 em 1914, e para 18 em 1925. Em 30 anos (1884-1914), a quantidade de estabelecimentos artesanais da sede desta colônia cresce cerca de 58%, porém, em 11 anos apenas (1914-1925), diminui aproximadamente 68%, o contrário do que aconteceu em Caxias do Sul, onde a quantidade de indústrias e casas comerciais sempre aumentou.

Enfim, este é apenas um pequeno detalhe de minha pesquisa. Precisaria muitas páginas para oferecer outras informações, dados, conceitos etc, referentes ao processo de apropriação e produção do espaço geográfico que estou estudando. Espero poder divulgá-la em breve.

Quantos italianos vieram para o Brasil? Quais as maiores contribuições que eles nos trouxeram?

Esta é uma pergunta muito difícil de se responder devido às imprecisões da principal fonte de dados, mas podemos aproximar uma estimativa, de acordo com os dados oficiais. Conforme os dados do IBGE, entre 1881 e 1939, entraram no Brasil, 4.225.638 imigrantes, dos quais, 1.438.099 italianos, ou seja, 34%, destinados, principalmente, para os estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Espírito Santo. Os italianos são o maior percentual, seguidos pelos portugueses e espanhóis. O período de maior entrada de italianos no país é entre 1884 e 1893, em decorrência das condições favoráveis para tal. No Rio Grande do Sul, de acordo com os dados do Anuário Estatístico, o período de maior entrada de italianos é entre 1887 e 1891. Do total de imigrantes que chegam a este estado (154.682), entre 1882 e 1914, em torno de 43% são italianos (66.901).

Estes italianos e seus descendentes contribuem significativamente à formação do Rio Grande do Sul e do país, como já foi estudado por vários autores. Eles dão nova forma e conteúdo ao espaço geográfico através de suas atividades cotidianas, sejam produtivas, culturais etc. Contribuem no incremento da produção agrícola, das atividades mercantis e industriais, nas atividades políticas e culturais, marcados pela religiosidade e demais costumes que procuram reproduzir aqui no Brasil. É difícil medir as mais ou menos importantes. Com o passar dos anos, alguns costumes se perdem, outros permanecem, principalmente na alimentação, o que caracteriza os tempos e os espaços da colonização e imigração neste país, onde as diferenças formam uma certa unidade, que é a unidade da Nação Brasil.

Quem foram os maiores beneficiados com a vinda deles? Os próprios imigrantes? O Brasil, que os recebeu? A Itália, que os mandou embora? Como o sr. vê esta questão?

No meu entendimento, os maiores beneficiados com os processos de imigração e colonização italiana, são os agentes do capital e os Estados brasileiro e italiano, porque, de diferentes formas e intensidades, se apropriam de parte significativa da riqueza produzida por eles em suas produções. As práticas da agricultura camponesa (ou familiar) no Rio Grande do Sul e mesmo a do colonato em São Paulo, subordinam os produtores diretos aos imperativos do capital, que, intimamente articulado ao Estado, rege a colonização no país. Talvez eu esteja sendo economicista até o momento, mas estou tentando superar esta adjetivação e, sobretudo, creio que se faz necessário desmascarar as forças dominantes que "jogaram", no caso de Silveira Martins, os italianos em plena encosta do planalto, na mata nativa, no final do século passado, onde lutam com todas as forças possíveis para sobreviver, praticamente abandonados pelos administradores da Província. Enfrentam inúmeras dificuldades, com técnicas rudimentares para a produção, pouquíssimos instrumentos de trabalho, sem assistência médica, pouquíssimas escolas etc, mas, de forma geral, conseguem sobreviver e construir verdadeiros territórios no território do Rio Grande do Sul e mesmo do país. Agora, como já mencionei, um desafio para mim, e certamente para outros pesquisadores, é trabalhar as dimensões cultural e política articuladas à econômica, como estamos tentando efetivar.

O sr. deseja chamar a atenção para alguma outra questão?

É importante reforçar para os interessados, a importância para a atenção ao método, ou seja, aos pressupostos teóricos e metodológicos, porque é este fundamental em qualquer pesquisa científica e sem dúvidas, irá qualificar ou não um processo investigatório.

Quero também parabenizar o Italiaoggi pela iniciativa, pelo seu site e agradecer a oportunidade que me foi oferecida. Espero em outra oportunidade poder apresentar mais detalhes sobre minhas pesquisas e também estou a disposição para troca de dados e informações (e-mail: saqbales@wln.com.br).            

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