Edilson Saçashima
Do UOL Notícias
Em São Paulo
Os dados econômicos que são divulgados diariamente não deixam dúvidas
sobre a gravidade da crise que atinge todos os países. Ela pode ser
medida por meio dos números sobre retração econômica, queda de
produtividade e aumento de demissões. Porém, há um outro efeito
produzido pela crise que ainda parece nebuloso, mas que já pode ser
visto como um sinal de alerta. Nota-se uma maior aversão ao imigrante
nas principais economias do mundo. Partidos considerados de extrema
direita ganharam maior apoio popular nos últimos tempos. Ataques às
minorias étnicas e aos imigrantes, se ainda não podem ser considerados
recorrentes, ganham destaque na mídia. Países implementam políticas mais
duras de imigração. A xenofobia estaria aumentando em decorrência da
crise econômica?
Pesquisa publicada pelo jornal "Financial Times" em março mostra que
mais de três quartos dos italianos e dos britânicos e a maioria na
França, na Alemanha, na Espanha e nos Estados Unidos apoiariam que os
governos pedissem que os imigrantes deixassem o país. Nesses países, a
taxa de desemprego sofreu um grande aumento com a crise econômica. No
Reino Unido, por exemplo, o desemprego atingiu os números mais altos em
uma década.
Entre exemplos de medidas recentes contra imigrantes, o Senado italiano
aprovou, em fevereiro, um projeto que permite a médicos denunciarem os
imigrantes à polícia. França e Espanha incentivaram, por meio de leis, o
retorno voluntário de imigrantes. O governo espanhol propôs ainda uma
reforma na lei de imigração, ainda por ser votada, que prevê multa para
quem der ajuda a imigrantes ilegais.
Os dados do desemprego explicam, de certa forma, o porquê de o imigrante
ser o elo mais frágil na cadeia produtiva de uma economia. Em tempos de
crise, ele, em geral, se torna o alvo principal dos ataques do
trabalhador nativo. "Os imigrantes, por princípio, não são cidadãos.
Eles são vistos como os que vieram de foram para trabalhar. No país,
eles ocupam um espaço e um trabalho que o nativo não quer fazer", diz o
demógrafo Duval Magalhães Fernandes, professor da PUC-MG. "Em geral, em
épocas de crise, o imigrante é sempre o diferente", acrescenta.
Aumento da xenofobia?
No Dia Internacional contra a Discriminação Racial, celebrado no último
dia 21, três organizações europeias, entre elas o Conselho Europeu
contra o Racismo e a Intolerância, divulgaram uma nota conjunta em que
se diziam estar "alarmadas com os relatos que dão conta de ataques
violentos contra imigrantes, refugiados e exilados políticos, e minorias
como os ciganos". "A história europeia mostra como a depressão econômica
pode levar à exclusão social e à perseguição. Estamos preocupados que,
em tempos de crise, os migrantes, as minorias e outros grupos
vulneráveis, se tornem o 'bode expiatório' para políticos populistas e
para a mídia", escreveram.
No entanto, a aversão ao estrangeiro não seria produto direto da crise.
"A xenofobia já existia antes da crise. Ainda é difícil dizer se ela
aumentou com a crise econômica", diz Catherine de Wenden, cientista
política e diretora do Centro de Estudos e de Pesquisas Internacionais
da Fundação Nacional de Ciências Políticas de Paris.
Wenden vê a adoção de leis de imigração mais duras nos países europeus,
em especial contra os imigrantes não qualificados. "Mas são ações
anteriores à crise, não são medidas novas", diz. Segundo a cientista
política, o endurecimento da política de imigração se diferenciaria de
uma atitude xenofóbica por buscar deter a entrada de um certo tipo de
estrangeiro, como os trabalhadores não qualificados e os radicais
islâmicos. "Já a xenofobia é o ódio ao estrangeiro", diz.
Fernandes, por sua vez, acredita que exista uma tendência xenofóbica nos
países europeus. "O discurso antiestrangeiro encontra terreno fértil
junto às pessoas que perderam o emprego e o crescimento da extrema
direita demonstra isso", diz.
"O monstro do nazismo e do fascismo não foi destruído. Ele está latente,
presente", sugere o demógrafo. Ele cita como exemplo o caso da
brasileira que disse ter sido atacada por neonazistas na Suíça. "O
episódio se mostrou uma farsa, mas, na época, todos aceitaram a versão
dela. O caso não foi considerado absurdo. Se tivesse ocorrido no Brasil,
haveria um grande estranhamento", diz.