Na próxima semana, o Conselho de
Ministros da Itália deverá apreciar o novo texto da lei que rege a
imigração no país. Já sem condições de prescindir da mão-de-obra dos
estrangeiros, o país procura harmonizar suas necessidades ao mesmo tempo
em que disciplina e normatiza o ingresso de imigrantes. Mais uma vez,
apesar de estar sendo saudada como um avanço, a lei não trabalha a
especificidade dos descendentes de italianos que buscam o país de origem
de seus ancestrais, mais uma vez tratados com indiferenciação ou até
com mais restrições e exigências – como no caso na obtenção da
cidadania.De qualquer forma, a chamada lei Amato-Ferrero, que
substituirá a Bosi-Fini – referências às autoridades governamentais das
pastas responsáveis pela sua implementação – ao tratar genericamente os
imigrantes, reflete uma posição em relação aos italianos que foram
obrigados a deixar o país em busca da cidadania negada que se faz
presente até mesmo no processo de formação cultural do país. Afinal, o
processo migratório do final do século XIX e do início do século XX
quase invariavelmente não é tratado com relevância nas ementas do ensino
italiano.
O objetivo chave da Lei é o de efetivar os canais de ingresso legal
dos imigrados na Itália, como um antídoto para a clandestinidade. Além
de modificações em termos dos fluxos dos imigrantes, que serão trienais,
com uma estimativa que prevê o ingresso de 250 a 300 mil trabalhadores
por ano, ou cerca de um milhão a cada três anos. A cota para o trabalho
doméstico e de assistência à pessoa poderá ser flexibilizada. Da mesma
forma, terão via livre, ingressos fora de cota, os administradores,
professores universitários, artistas e trabalhadores especializados.
Serão introduzidas listas de permanência no exterior, para as quais
poderão se inscrever os interessados em emigrar para a Itália. Essas
listas serão confiadas aos consulados e organizações internacionais que
mantém acordos com o Estado italiano. Um detalhe muito importante: a
partir da aprovação do novo texto, será levado em conta o conhecimento
da língua. Ou seja, terá mais facilidade quem souber falar o idioma
italiano. Igualmente serão considerados os diplomas de formação e a
especialidade profissional do migrante.
No caso de perder o emprego, o imigrante terá prolongado por um ano a
duração do seu visto de permanência para “aguardo de ocupação”. O
trabalhador com visto de permanência de longo período será equiparado
aos cidadãos da União Européia, inclusive tendo direito a disputar
concursos públicos para acesso ao trabalho na administração pública.
A nova lei deverá estabelecer ainda o direito de voto nas eleições
administrativas – municipais – para os emigrados com visto de
permanência, residentes no país há pelo menos cinco anos.
Outra novidade será a introdução do promotor, tanto institucional
quanto privado (entes locais, sindicatos, associações empresariais,
cidadão comum), que poderão garantir economicamente a estadia do
estrangeiro.
Em última análise, as mudanças pretendem combater o trabalho ilegal
ao mesmo tempo em que estabelece diretrizes para atender a demanda por
mão-de-obra. Além de humanizar o processo. No entanto, o paradoxo
continua sendo em relação aos imigrantes, para os quais poderiam ser
criados mecanismos diferenciados. Para tanto, na verdade, falta algo: o
Estado italiano reconhecer a dívida moral, ética e humanitária que tem
em relação aos cidadãos e cidadãs que foram “estimulados” – pelo próprio
Estado - a deixar sua terra. Essa é uma questão de direito que ainda
deverá ser enfrentada. Mais cedo ou mais tarde.
Veja algumas das principais alterações que estão sendo previstas:
VOTO
Somente para as eleições administrativas
A lei Amato-Ferrero reconhece o direito eleitoral ativo e passivo às
eleições administrativas, a favor de todos os emigrados regulares com
visto de permanência de longo período. Urnas abertas aos trabalhadores
estrangeiros com visto de permanência, residentes na Itália a menos de
cinco anos, em conformidade com a Convenção de Strasburgo, de 5 de
fevereiro de 1992, como já previsto em muitos países europeus.
HOJE - O voto administrativo, assim como o político, é reservado aos
cidadãos italianos, como disposto no artigo 48 da Constituição.
O TRABALHO
Listas no exterior
A nova lei prevê a abertura de listas para vistos de permanência no
exterior para quem quer emigrar para a Itália. As listas serão
organizadas pelos consulados ou pelas organizações internacionais, após
a elaboração de uma convenção com o Estado italiano e levarão em conta
os títulos de estudo e o nível de conhecimento da língua italiana dos
trabalhadores estrangeiros que decidem inscrever-se.
HOJE - Para entrar na Itália, o imigrado deve possuir um contrato de
trabalho. Mas quem assume um desconhecido?
EMPREGADA DOMÉSTICA
Também fora da cota
A nova lei prevê que a cota, estabelecida para trabalho subordinado
doméstico de assistência à pessoa, possa ser ampliada. Caso as
solicitações de emprego sejam superiores à medida pré-fixada, poder-se-á
aumentar a cota pré-estabelecida.
HOJE - Empregada doméstica e acompanhante que trabalham na Itália
são vinculadas às cotas estabelecidas pelo decreto de fluxo anual.
PROMOTOR
Institucionais e privados
Volta o promotor, já previsto pela lei Turco-Napolitano. Promotor
institucional: entes locais, sindicatos e associações empreendedoras,
prontas a garantir economicamente o imigrado. Promotor privado: cidadão
comum, com renda suficiente para garantir seus empreendimentos
patrimoniais.
HOJE - O promotor previsto pela lei Turco-Napolitano foi cancelado
pela lei Bossi-Fini. Hoje não existe.
OS CONCURSOS
Equiparação aos cidadãos europeus
Com a nova lei, os trabalhadores estrangeiros, com visto de
permanência de longo período na Itália, serão equiparados ao cidadão da
União européia, com a finalidade de ter acesso ao trabalho e à
Administração Pública. Também acesso a concursos públicos. Não só. Estes
imigrados terão equiparação aos europeus no que se refere à assistência
social.
HOJE - Os emigrados regulares têm acesso aos empregos nos órgãos da
administração pública.
CPT
Acolhimento potencializado
L´AMATO-Ferrero (lei) revoluciona o sistema do CPT. Serão
potencializados os centros de acolhimento, com acordos com ASI e
Associações Humanitárias para a gestão. Muda o nome do CPT .(
Chamar-se-ão: Centros de Expulsão ) e serão reduzidos em número:
servirão somente para abrigar os imigrados clandestinos “ irredutíveis”.
Os centros serão abertos a visitas de jornalistas e associações.
HOJE - Os 14 CTP presentes hoje na Itália,
encontram-se em meio a grande confusão. Médicos sem Fronteira, denúncia
abusiva e violação dos direitos.
Embora não seja marcada por um fenômeno profundo de racismo, a
sociedade italiana está enfrentando uma tendência à xenofobia e ao
desenvolvimento de manifestações racistas, afetando principalmente
imigrantes e asilados de origem africana, mas também da Europa Oriental
e a comunidade muçulmana. Esse é um trecho das observações preliminares
do relatório do enviado especial da ONU à Itália, Doudou Diene, que
esteve no país em outubro do ano passado para avaliar os elementos
discriminatórios em relação a estrangeiros, trabalhadores imigrantes,
refugiados e solicitantes de asilo.
Na visão do relator das Nações Unidas, cujo trabalho foi apresentado,
nesta semana, em Genebra, os grupos mencionados sofrem modos diferentes
de marginalização institucional e socioeconômica e discriminação
cultural e religiosa.
Diene considerou alarmantes as informações recebidas a respeito das
condições de trabalho para imigrantes no setor agrícola e a situação de
mulheres, vulneráveis a condições abusivas em trabalhos domésticos, além
de notar a elevada presença de estrangeiras no âmbito da prostituição.
Em relação às políticas adotadas pelas autoridades, o relator da ONU
saudou as ações do Governo e o seu firme compromisso no sentido de
combater o racismo e a xenofobia. Nesse contexto, ele destacou o projeto
de lei que deverá ser apreciado pelo Parlamento com reformas no campo da
imigração.
Leia, na íntegra, o relatório da ONU:
http://www.ohchr.org/english/bodies/hrcouncil/docs/4session/A-HRC-4-19-Add-4.doc