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Ayaan Hirsi Ali,
imigrante que chegou ao parlamento holandês, mas corre risco de
ser expulsa |
Continente exige aceitação de valores por parte
de estrangeiros
Colin Nickerson
The Boston Globe
Uma mulher nua diverte-se na praia.
Homossexuais se acariciam num parque. Essas imagens fazem parte de um
vídeo intitulado Vindo para a Holanda, apresentado pelo governo a
futuros prováveis imigrantes. Ele faz parte de medidas de controle
adotadas recentemente, para determinar se os novos imigrantes aceitam os
"valores" ocidentais. Qualquer um que se ofender com essas imagens,
pondera a autoridade holandesa, provavelmente se sentirá infeliz no país
e não deve ser admitido.
Por toda a Europa, países que durante décadas acolheram generosamente
imigrantes e refugiados hoje já não estendem mais o tapete de
boas-vindas.
O sentimento antiimigrante, beirando a xenofobia - que antes era
limitado a poucos partidos de direita - transformou-se na política
oficial em países como Holanda, França, Alemanha e Grã-Bretanha. Novas
leis criam mais obstáculos para os recém-chegados, especialmente
muçulmanos, e são encorajadas por muitos europeus. Pesquisas indicam
que, em quase todos os países da Europa, a maioria é favorável não só a
que sejam aumentadas as restrições à vinda de imigrantes comuns, como
também a que as autoridades sejam menos suscetíveis às histórias dos
refugiados que buscam asilo político.
Os alarmes que soam têm uma base econômica, como a eterna preocupação de
que os imigrantes roubem os empregos dos cidadãos locais. Os analistas,
porém, acham que os europeus estão mais temerosos do terrorismo e da
expansão rápida da cultura islâmica.
Muitos imigrantes e refugiados sem documento que chegam ao continente
europeu vêem da África rural, da Turquia e sul da Ásia. Eles estão
mudando a face da Europa Ocidental. É mais fácil comprar um "kebab" em
Roterdã do que o tradicional arenque em conserva holandês; Berlim é a
maior "cidade turca" fora da Turquia; e os distritos comerciais nos
subúrbios de Paris parecem um bazar norte-africano.
Na França, há duas semanas, foi aprovada preliminarmente uma lei que
restringe drasticamente a imigração de trabalhadores não qualificados
vindos de fora da Europa, estabelece regras mais rígidas para aquisição
da cidadania francesa e dificulta a vinda de famílias de trabalhadores
que já estão no país. Na Alemanha, este mês, a chanceler Angela Merkel
endossou um plano para a criação de testes mais rigorosos para aquisição
de cidadania alemã.
A ministra holandesa da Imigração, Rita Verdonk, parece expressar a
opinião que vem prevalecendo, ao comentar publicamente: "É importante
termos claras as reivindicações populares. Eles precisam aceitar nossos
valores, respeitar nossas leis, aprender nossa língua."
A justificação dada para as medidas adotadas é uma melhor assimilação
dos imigrantes. O que é um novo programa de ação para a Europa, que
durante muito tempo adotou a política multiculturalista de abordagens
diferentes para raças diferentes. Hoje, porém, o tema principal das
agendas nacionais é promover a integração ao estilo americano, após os
atentados a bomba cometidos na Grã-Bretanha por radicais islâmicos que
cresceram naquele país, dos distúrbios em guetos muçulmanos na França,
dos assassinatos de personalidades públicas holandesas por extremistas
religiosos, e o furor global após um jornal dinamarquês publicar
caricaturas representando o profeta Maomé.
Alguns analistas consideram essas novas leis um recuo. O continente viu
nervosamente sua população muçulmana crescer, de algumas centenas de
milhares após a 2ªGuerra a mais de 15 milhões.
"A desconfiança e o medo dos muçulmanos são mais intensos na Europa do
que nos EUA, mesmo imediatamente após o 11 de Setembro", diz Kees
Groenendijk, chefe do Centro para as Leis de Imigração da Universidade
de Nijmegen, Holanda.
"Ao contrário dos EUA, nossos políticos não enfatizam muito o fato de
que imigrantes legalizados, pessoas ordeiras, não são um problema e que
necessitamos deles para nossa prosperidade e nossa sobrevivência como
uma economia aberta."
A Holanda ficou chocada com os assassinatos por extremistas islâmicos,
em 2002, do político Pim Fortuyn, que alertou para o fato de o país
estar admitindo um número excessivo de islâmicos, e, em 2004, do
produtor de cinema Theo Van Gogh. E o país mudou, de sociedade mais
aberta da Europa para um país com a linha mais dura do continente. Entre
outras coisas, está prometendo expulsar mais de 26 mil refugiados que
obtiveram asilo com base em informações falsas. Essas pessoas receberam
asilo por causa de suas alegações de perseguição religiosa, política ou
étnica em seu país natal.
Um fato dramático ocorreu na semana passada, quando o governo holandês
decidiu tirar a cidadania de uma deputada, conhecida internacionalmente
por insistir para que os europeus defendam com mais rigor sua cultura
contra os imigrantes muçulmanos. Ayaan Hirsi Ali, que precisou viver sob
proteção policial por causa de sua campanha contra os maus-tratos
sofridos pelas mulheres em países muçulmanos, admitiu ter mentido sobre
os motivos pelos quais pediu asilo político, em 1992. Mas mesmo os
intransigentes críticos à imigração na Holanda, ficaram estarrecidos
quando Verdonk tentou anular a cidadania de Ayaan. A decisão foi revista
após duras críticas feitas por jornais e políticos em toda a Europa.
Novas leis na Holanda agora exigem que os prováveis imigrantes passem
por exames sobre língua, história e cultura holandesas, na embaixada em
seu país natal. E devem assistir ao polêmico vídeo, que mostra também
enclaves de imigrantes superlotados e outras cenas calculadas de forma a
dar uma visão realista da vida no Ocidente.
Na França, o ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, tem advertido aos
novos imigrantes: "Ame a França ou deixe-a."
(©
Agência Estado) |