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Em meio a fantasmas, italiano discute a vulnerabilidade humana



 

Sergio Castellitto e Penélope Cruz

CLAUDIO SZYNKIER
FREE-LANCE PARA A FOLHA

   O flashback em "Não se Mova" é um procedimento médico. Uma incisão, realizada para vasculhar o passado. Talvez uma autópsia. Não por acaso, falamos de um médico, às voltas com a filha em cirurgia e com as memórias da relação com uma moça da árida periferia. Estamos em um filme sobre gente doente, seja pela vulnerabilidade do homem, seja pela precariedade sanitária. Sobre gente (meio) morta. Fantasmas, que, aliás, também existem na idéia de visita a outro tempo. Mesmo entre os vivos, impera uma dissonância fantasmagórica entre sua imagem de agora e a de 15 anos antes. Uma é fantasma da outra.

   De instância divina, que cura e domina o instrumental de intervenção no corpo, o médico se transformará, não raro, em impotente observador, incapaz diante do que ocorre nos corpos que vê. E é justo dizer que somos também impotentes, se ele, como personagem, vai se deformar e se reformar muitas vezes ao nosso olhar.

   Pois, se o cheiro é de infecções e cadáveres, o que norteia o filme é um desejo pela manifestação da vida. Está claro em vários fluxos animais que se conjugam aqui. Fluxos selvagens de corpos e de territorialidade -abordada no movimento de invadir e se misturar a um lugar estranho. Mas está claro sobretudo nessa crença do italiano Castellitto na impossibilidade de decifrar e ordenar a condição humana: antes, ele a persegue.

   Este é um filme cenicamente dos mais cafonas e carregados. Mas há grande fé no que se mostra e na exacerbação disso. Não se encharcam as imagens e o tom para produzir camuflada ridicularização ou efeito kitsch: acredita-se de fato que essas imagens, quase equivocadas, desreguladas, guardam alguma sóbria verdade sobre as pessoas e seu estado. E essa é uma convicção que soa como fantasma hoje, tempo do cinismo como mecanismo de sobrevivência. É uma convicção de risco, aliás, de vida.

Não se Mova
Non ti Muovere

   
Direção: Sergio Castellito
Produção: Itália/Espanha/ Inglaterra, 2004
Com: Sergio Castellitto e Penélope Cruz
Quando: a partir de amanhã no Cineclube Vitrine 1, Lumière 2, Market Place Playarte 3 e circuito

(© Folha de S. Paulo)


Penélope Cruz reforça elenco italiano de "Não se Mova"

SANDRO MACEDO
do Guia da Folha

   Com carreira extensa como ator, Sergio Castellitto ("Simplesmente Martha") faz sua segunda incursão como diretor com o drama "Não se Mova", co-estrelado por Claudia Gerini ("A Paixão de Cristo") e Penélope Cruz ("Vanilla Sky").

   Castellitto acumula ainda as funções de roteirista --em parceria com Margaret Mazzantini, autora do livro "Não se Mexa", que inspirou o longa-- e protagonista da trama, que apresenta um médico bem-sucedido, Timoteo, casado com uma bela mulher (Claudia Gerini) e pai de uma adolescente, que sofre um acidente na primeira cena do filme. Quando ela chega ao hospital em que Timoteo trabalha, ele começa a lembrar seus pecados, em longos flashbacks, enquanto um colega opera a jovem, em estado crítico.

   A lembrança --anterior ao nascimento da filha-- gira em torno de um romance, às vezes violento, com uma mulher (Penélope Cruz) muito pobre e com pouca instrução.

   A atriz espanhola, que não engasga no italiano, aparece desglamorizada, sem nenhum sex appeal. No entanto, está na empatia com o protagonista um dos segredos para se gostar ou não dessa co-produção européia. Contam-se nos dedos as cenas em que Castellitto não aparece em quase duas horas de projeção.

(© Folha Online)

Para saber mais sobre este assunto (arquivo ItaliaOggi):

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