Edição de luxo, em português,
agrupa as pinturas de Leonardo
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Existe uma manchinha minúscula nas costas da mão direita da senhora
"Mona Lisa". Uma pinta ainda menor está ali, quietinha, no lado esquerdo
de seu mundialmente enigmático sorriso.
Cristo também não terá mais qualquer vestígio de sossego em sua "Última
Ceia". Vai ter gente implicando com marquinhas no seu colo, com um fio
despenteado no alto de sua cabeça.
As
obras-primas (e mesmo as menos primas) de Leonardo da Vinci estão em
apuros. No ano em que o sobrenome do artista apareceu estampado em fundo
vermelho no topo das listas de livros mais vendidos de todo o país, com
a ficção "O Código Da Vinci", do americano Dan Brown, suas criações
voltam às livrarias (poucas) de um modo que nem o próprio artista pôde
enxergá-las.
"Leonardo da Vinci - Obra Completa de Pintura e Desenho" reúne cada uma
das 34 pinturas hoje conhecidas do artista da cidadezinha de Vinci e
reproduções de 663 de seus desenhos com ampliações até dez vezes maiores
do que seus originais.
Esta visita ao Louvre com um telescópio é obra da editora alemã Taschen,
maior empresa do mundo de livros de arte, que fez mais uma vez um volume
que não economiza em nenhum sentido. Com medidas que chegam a mais de
meio metro de altura e a quase dez quilos, este "anti-pocket book"
organizado pelo pesquisador alemão Franz Zöllner esbanja aqui nos
Trópicos também no tamanho dos cifrões.
Com seu preço de tabela nacional de R$ 980, a versão deste Da Vinci de
gala concorre sem muitos competidores ao título de livro mais caro
disponível no Brasil em língua portuguesa.
A
versão não é privilégio dos brasileiros. A edição deste "códice" Da
Vinci foi toda feita em Portugal, onde o livro já estava disponível há
alguns meses. Ainda que com os lusitanismos do antigo colonizador, não é
"facto" que mais conta no trabalho davinciano.
A
reunião pioneira de quase (os desenhos são muito mais vastos do que a
editora pôde imprimir, ultrapassando o milhar de rabiscos) todas as
imagens que se pode ajuntar do trabalho do gênio do Renascimento,
nascido em 1452 e morto em 1519, e a impressão e edição primorosas do
volume são os motivos dos elogios que o catatau vem colecionando em cada
país que foi lançado, desde a edição original, em 2003.
O
projeto de babelização do livro vai longe. Leonardo da Vinci não terá
paz nem em terras distantes como a de Franz Kafka. Está para sair do
forno "Da Vinci" completo em tcheco.
(©
Folha de S. Paulo)
A anatomia de Leonardo
"Raio-x" de artista florentino inclui
centenas de desenhos inéditos
DA REPORTAGEM LOCAL
Um
dos primeiros grandes fuçadores da anatomia da história, Leonardo da
Vinci também enfrenta uma espécie de raio-x em "Leonardo da Vinci - Obra
Completa de Pintura e Desenho".
A radiografia da chamada "vida e obra" é dividida em três etapas.
O
striptease do artista florentino começa de maneira panorâmica. O
primeiro segmento do volume da Taschen reúne um perfil cronológico da
carreira artística de Da Vinci tomando como base documentos da época.
Cartas, contratos, anotações e diários, mais do que as toneladas de
publicações analíticas póstumas sobre o artista, guiam o ensaio assinado
pelo organizador do trabalho.
Franz Zöllner privilegia os grandes projetos nos quais o artista esteve
enfiado, não as obras que o tornaram mais famoso. Assim, seus estudos
para um monumento eqüestre ao nobre Francesco Scorza que nem chegou a
ser concluído ganham mais espaço do que algumas de suas pinturas mais
famosas -Da Vinci chegou a elaborar uma "maquete" de sete metros em
argila do tal cavaleiro empinando um cavalo, posteriormente destruída
por arqueiros que nela treinavam sua mira.
A
segunda seção de "Da Vinci" funciona como um "catálogo raisonné" da
pintura do artista, cientista e pensador florentino. As suas 34 pinturas
hoje conhecidas são apresentadas uma a uma com informações caudalosas
sobre elas: quando foram atribuídas a Leonardo, quem escreveu os artigos
mais importantes sobre cada obra, quais deslocamentos a pintura teve até
chegar a sua presente coleção etc.
Para muitos especialistas, mas não para a grande massa, é a terceira
parte do catatau a de maior importância. No segmento "A Obra Gráfica",
que compreende mais de 400 das quase 700 páginas do livro, estão 16
pequenos ensaios sobre matrizes da produção de desenhos leonardianos.
Grafismos anatômicos (de onde são tirados os que ilustram esta página),
estudos de proporções (onde está o clássico "O Homem de Vitrúvio", que
você certamente já topou por aí -aquele homem carrancudo com duas
posições de pernas e de braços ao mesmo tempo, envolvido por um
círculo), estudos de plantas, de arquitetura e os impagáveis "estudos de
máquinas voadoras e vôos de pássaro" são alguns dos tópicos, nos quais
estão diluídas as principais "pepitas" da obra.
A
grande benfeitora deste segmento do livro é a sra. rainha da Inglaterra.
Praticamente metade dos 663 desenhos impressos em "Leonardo da Vinci"
fazem parte da coleção particular do Castelo de Windsor e são
reproduzidos pela primeira vez.
Uma alentada bibliografia, um índice onomástico não tão alentado assim e
outras tabelas técnicas completam o banquete.
Como o preço é também banqueteiro, vale lembrar outras saídas aos
"davincizófilos" um pouco menos abastados. Livrarias virtuais como
Barnes and Noble (www.barnesandnoble.com)
e Amazon (www.amazon.com)
fazem entregas de edições em inglês do mesmo livro por quase a metade do
preço.]
Outra alternativa, aí sim para bolsos bem mais curtos, é o volume
da série Basic Art editado pelo mesmo Franz Zöllner para a mesma
Taschen. Se o "códice" Da Vinci custa R$ 980, esta versão mini sai por
R$ 38,90. (CASSIANO
ELEK MACHADO)
LEONARDO DA VINCI - OBRA COMPLETA DE
PINTURA E DESENHO. Autor: Franz Zöllner. Editora: Taschen
(informações no Brasil com a distribuidora Paisagem: tel. 0/xx/11/
3045-2133). Quanto: R$ 980 (695 págs.).
(©
Folha de S. Paulo)
Italiano tira cetro "pop" de xará
DiCaprio
DA REPORTAGEM LOCAL
Até o início de 2003, o Leonardo mais pop do planeta vinha sendo
o tal do DiCaprio. Em março, um livro começou a mudar a sina dos
Leonardos. Com o sucesso repentino de "Código Da Vinci", do americano
Dan Brown, o já há séculos icônico artista de Florença passou a
(re)conquistar uma divulgação poucas vezes vista.
Em menos de um ano, o "thriller" que usa obras de Da Vinci como
pano de fundo já vendeu mais de 10 milhões de exemplares no mundo todo e
está a passadas largas dos concorrentes nas vendagens também no Brasil
(no levantamento da Folha, com oito redes de
livrarias, foram mais de 10 mil os "Códigos" vendidos só nesta semana).
No rastro do livro, uma proliferação de títulos davincianos
invadiram o mercado, muitos deles também na lista: "Revelando",
"Quebrando", "Desmascarando", "Decifrando", todos esses gerúndios
seguidos do termo "O Código Da Vinci" são acompanhados por títulos como
"Os Segredos do Código", "A Fraude do Código Da Vinci", entre outros.
Volumes mais sérios sobre o artista, como "Leonardo - Arte e
Ciências/As Máquinas" também deram as caras. E a febre ainda vai longe.
(CEM)
(©
Folha de S. Paulo)
OBRAS
1469-1480
O pai de Da Vinci, Piero, vê o filho de 17 anos fazendo desenhos em casa
e resolve mostrá-los a um artista, Andrea del Verocchio. Este recomenda
que ele estude arte imediatamente. Pouco depois, já fazia obras à
"Retrato de Ginevra de" Benici".
1480-1482
Assina seus primeiros contratos individuais e, sem o amparo da oficina
de Andrea del Verocchio, faz, em Florença, trabalhos como o incompleto
"Adoração dos Magos" e um "São Jerônimo" que evidencia a originalidade
do jovem Leonardo.
1506-1510
A monumental e inacabada "Virgem e Menino com Santa Ana", hoje no
Louvre, é o tema central deste "capítulo" do livro. No período, Leonardo
trabalha ainda como arquiteto (elabora redes de irrigação) e volta a
morar em Milão.
1483-1484
Muda-se para Milão e lá faz uma de suas primeiras obras-primas. "A
Virgem dos Rochedos" entra para a história por ser das primeiras grandes
pinturas realizadas para ornamentar uma igreja que é logo tirada de seu
contexto religioso.
1485-1494
Lança-se em projeto ambicioso, a maior estátua eqüestre de seu tempo.
Documentos da época afirmam que ele fez um estudo em barro de sete
metros de altura, depois destruído. Pinta também a obra-prima "O Arminho
Como Símbolo de Pureza".
1494-1495
Curto período no qual Leonardo esteve mais diretamente envolvido com
estudos científicos e mais especificamente anatômicos, prática iniciada
em 1489, pouco antes de fazer seu desenho "técnico" mais reproduzido até
hoje, o chamado "O Homem de Vitrúvio".
1495-1499
Leonardo realiza uma de suas duas obras mais conhecidas, a têmpera
"Última Ceia" (1495-1497), tema de dezenas de páginas do livro. O
período é encerrado com a queda de Ludovico Sforza, patrono do artista
até então.
1500-1503
Período no qual volta a Florença, trabalha, entre outras funções, como
engenheiro militar e inicia a obra de arte mais conhecida da história,
"Retrato de Lisa del Giocondo", mais conhecida como "Mona Lisa" ou
"Gioconda", que terminaria em 1506.
1510-1519
No gomo final de sua vida, Leonardo dedica-se cada vez menos à pintura.
Trabalha incansavelmente com desenho anatômico e volta a projetar uma
grande estátua eqüestre (também não concluída). Faz como um dos últimos
óleos "S. João Batista", concluído em 1516.
(©
Folha de S. Paulo) |