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A pintura não morre

Fotos:Otávio Dias de Oliveira/ÉPOCA

EM AÇÃO O artista continua trabalhando em seu ateliê em São Paulo

Aos 82 anos, Arcangelo Ianelli vence a doença, lança livro e prepara exposição

Federico Mengozzi

   Em outubro de 2002, no dia em que inaugurava exposição na Pinacoteca do Estado de São Paulo, Arcangelo Ianelli sofreu um acidente vascular cerebral. Foi internado em estado muito grave e, meses depois, saiu andando. A recuperação foi extraordinária, ainda que lhe falte coordenação à mão direita - Ianelli está exigindo mais da esquerda, e já assina com ela - e que não consiga falar. Mas entende tudo e, segundo a filha Katia, tanto quanto gosta dos exercícios de fisioterapia, odeia os de fonoterapia. Talvez pense: ''Falar, pra quê?'' Há mais de meio século ele fala ao mundo por meio de sua obra, uma das mais rigorosas já empreendidas por um artista brasileiro. A doença está ficando para trás. E parece que Ianelli, que continua produzindo, como sempre e com o mesmo padrão, também está deixando a idade (tem 82 anos) para trás, como se fosse mero detalhe.

   A agenda anda apertada. Ele acaba de lançar o livro Ianelli, um vislumbre de sua trajetória, com textos de Eduardo da Rocha Virmond, José Roberto Teixeira Leite, Juan Acha e Paulo Mendes de Almeida. A jornalista e poeta Mariana Ianelli, sua neta, assina o texto sobre sua vida e obra. Ainda neste semestre, ocorrerá o lançamento em Belo Horizonte e Curitiba. Em agosto, apresentará a mostra Ianelli: os Caminhos da Figuração, na Fundação Armando Álvares Penteado, em São Paulo. A exposição, com curadoria de seus filhos Katia e Rubens, ele também artista plástico, reúne 90 óleos figurativos sobre tela, 70 inéditos entre o público, executados de 1944 a 1960. O material é parte das 300 obras figurativas que Ianelli conserva no acervo pessoal - apesar de ser um dos maiores nomes da abstração brasileira. Não bastasse, ele trabalha para constituir o instituto que levará seu nome e preservará sua obra, na casa em que morava e na qual trabalha, no bairro do Paraíso. Isto é, nas casas.

REFLEXOS
O Menino Pintor, de 1952
EXPRESSÃO Retrato de Rubens, de 1957 COR Composição em Vermelho, 1973

   O pintor herdou duas casinhas do pai e, aos poucos, comprando imóveis vizinhos, juntou 16 casas. Há tempos, as escolas da região aprenderam a visitar a casa e o ateliê. É um espaço de exceção, mais de 2.000 metros quadrados repletos de verde e peças de arte, como o espaço que reservou para mostrar suas esculturas. Agora, ele quer formalizar a criação de um instituto aberto ao público e garantir a manutenção da obra que construiu a vida inteira. Ianelli nunca deixou de trabalhar e se preocupou em reservar para si parte da produção, que tem apreciáveis valores de mercado. Além das telas, o acervo inclui trabalhos em papel, esculturas, relevos pintados. No Brasil, existem exemplos como os de Lasar Segall e Tomie Ohtake, mas o mais comum é que os parentes sejam agentes de dispersão do trabalho de ''seu'' artista. Ianelli e família querem preservá-lo. ''É uma obra'', diz Katia, ''que se explica por si. Bem didática. Era preciso, e convencemos a família disso, mantê-la coesa.''

A escultura, descoberta recente, está afinada com suas telas

   Coerência. É a palavra que pode definir, como nenhuma outra, a trajetória do artista. De formação autodidata, não se curvou aos cantos de sereia do momento e, ao aderir à abstração, não o fez de maneira atabalhoada, como aconteceu com tantos colegas. Os ventos abstracionistas começaram a bater por aqui nos anos 50, com as Bienais de São Paulo. Ele, que começou acadêmico e, mesmo na figuração, já simplificava ao máximo o que podia, tornou-se abstrato no início da década de 60, com uma série de telas que o aproximam do despojamento de Milton Dacosta. Para Ianelli, a abstração veio de forma coerente com o que fazia, não contradizendo seus tempos figurativos, antes, enfatizando-os.

FORMA
Interior de Atelier, de 1956
EXPERIÊNCIA
Sem Título, de 2001
FACHADAS
Saracura, de 1958

   Arcangelo Ianelli, assinalou Mário Pedrosa, maturou o ''crescimento interno em profundidade''. Foi fiel a si mesmo, a partir da premissa de que menos pode ser mais, mas não se fechou numa torre de marfim. Sua obra acusa reflexos de quem muito participou e viu, sem perder a convicção pessoal. A neta Mariana reconhece a homogeneidade de seu trabalho. ''Ao analisar a obra de meu avô é difícil fugir da palavra coerência. Uma fase sempre prenuncia a outra e, ao passar da figuração à abstração, ele sintetiza o próprio percurso da história da arte contemporânea.'' Homem afável, querido pelos colegas, Ianelli não mudou. Mesmo com dificuldade, insiste em dizer, contra todos aqueles que decretam a morte da arte, que a ''pintura não morreu''. Mas se irrita um pouco com a limitação física. E reage, por exemplo, executando esculturas, uma descoberta tardia e afinada com sua pintura. Dribla as limitações pela força de vontade. Diz Katia: ''Meu pai tem muita disciplina. Na vida e na obra''.

GEOMETRIA
Casas, de 1960
NA MADEIRA
Sem Título, 2000

(© ÉPOCA)

Para saber mais sobre este assunto (arquivo ItaliaOggi):

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