A mostra apresenta ainda gravuras sobre a cidade italiana e peças da
Coleção Arqueológica Imperatriz Teresa Cristina
DA SUCURSAL DO RIO
Quase todos os pedaços da história de Pompéia, a cidade destruída pela
erupção do vulcão Vesúvio em 79 d.C, estão na Itália, principalmente no
sítio arqueológico onde se preserva o que sobrou da tragédia. Mas há
quatro pedaços que vieram parar no Brasil no século 19. Eles são os
astros de "Afrescos de Pompéia: A Beleza Revelada", exposição no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro.
Os afrescos não passavam por um processo de restauração desde 1918. No
ano passado, a União Latina, organização intergovernamental que reúne 35
países, patrocinou a recuperação, feita pelo especialista Pietro
Tranchina.
"Os [dois] afrescos claros estavam um pouco melhores, mas os escuros
eram uma caixa preta. A cera negra foi endurecendo com o tempo, e as
imagens ficaram irreconhecíveis. Com muito cuidado, pouco a pouco foi
sendo revelada a beleza que havia por baixo", diz Martha Vianna,
diretora do escritório da União Latina no Brasil.
Para a exposição, a organização angariou três patrocínios e foi um pouco
além dos quatro afrescos. Há gravuras sobre Pompéia cedidas pela
Biblioteca Nacional, peças da Coleção Arqueológica Imperatriz Teresa
Cristina e um retrato da imperatriz feito pelo espanhol Modesto Brocos.
Foi graças a Teresa Cristina que os afrescos vieram parar no Brasil. Ela
chegou ao Rio em 1843, aos 21 anos, para consumar um acordo político e
se casar com o imperador d. Pedro 2º. Já trouxe na bagagem várias peças
arqueológicas, uma de suas paixões.
Mas os afrescos de Pompéia chegaram mais tarde em razão de uma
negociação de Teresa Cristina com seu irmão, o rei Ferdinando 2º, das
Duas Sicílias (reino extinto com a unificação italiana). A família
Bourbon, dos dois, fora responsável por escavações em Pompéia, das quais
saiu grande parte do acervo do Museu Bourbonico, hoje Museu de Nápoles.
Em troca de objetos de arte indígena, o rei enviou à irmã um conjunto de
dez afrescos. Os outros seis se perderam.
"Um dos objetivos da exposição é lembrar que essa mulher manca e feia,
ofuscada pela figura de d. Pedro 2º, legou muita coisa importante para o
Brasil", ressalta Martha Vianna, que também pretende cativar
patrocinadores para a restauração de outras peças da Coleção Teresa
Cristina.
A coleção fica no Museu Nacional da Quinta da Boa Vista, onde aconteceu
a restauração dos afrescos, entre janeiro e março de 2004. Fotos do
trabalho conduzido por Pietro Tranchina também fazem parte da exposição.
O francês Henri Lavagne, consultor de arte da União Latina, descobriu
recentemente a origem de três dos afrescos: eles são parte do Templo de
Ísis. Os dois escuros, que mostram um cavalo-marinho e um dragão
marinho, ficavam na sala de reuniões dos devotos da deusa, na parte
inferior do templo.
Um dos claros, que mostra um pavão, ficava na superior. Não se sabe de
onde é o quarto afresco, que tem a imagem de dois pássaros e uma cesta
de guirlanda.
Ainda será exibido na exposição um DVD que reconstitui Pompéia
virtualmente. Segundo a União Latina, o DVD, cedido pelo Instituto
Italiano de Cultura, só foi exibido uma vez fora da Itália, nos Estados
Unidos.
Afrescos de Pompéia: A Beleza Revelada
Quando: até 29/5 (ter. a sex., das 10h às 18h; sáb. e dom.,
das 14h às 18h)
Onde: Museu Nacional de Belas Artes (av. Rio Branco, 199, centro,
tel. 0/xx/21/ 2240-0068)
Quanto: R$ 4 (grátis aos domingos)
(© Folha
de S. Paulo)
O tesouro italiano no baú de Teresa Cristina
Daniela Name
Bastou ela desembarcar da fragata Constituição e pisar no porto do Rio
para dom Pedro II ter um piripaque : naquele dia de 1843, o
rapazote sentiu calafrios, quase desmaiou... e acabou aos prantos, no
colo da aia. Pedro nem era um adolescente mala . Nunca teve
fama de mimado e gozava de ótima saúde. Mas não resistiu à visão de sua
futura mulher, Teresa Cristina.
Coxa, gorda e feia à beça, a mocinha italiana desembarcava aqui para
mergulhar num casamento arranjado com o imperador do Brasil. Sua falta
de atributos físicos era inversamente proporcional à inteligência. O
dote de casamento? No lugar de um exagero de jóias e vestidos, trouxe
baús com peças arqueológicas de Pompéia. É este tesouro da imperatriz
que o Museu Nacional de Belas Artes apresenta a partir de amanhã, quando
inaugura para convidados a exposição “Afrescos de Pompéia — A beleza
revelada”.
A abertura para o público acontece amanhã e o grande destaque da mostra,
que tem ambientação de Daniela Thomas, são quatro raríssimos afrescos da
cidade soterrada pela lava do vulcão Vesúvio, em 79 d.C. Recuperadas com
patrocínio da União Latina, as peças estavam fechadas em caixotes, no
acervo do Museu Nacional, desde 1918. A pesquisa do restauro acabou
descobrindo que as quatro peças faziam parte do Templo de Ísis, uma das
construções mais importantes da cidade de Pompéia.
O templo aparece numa das gravuras do século XIX que retratam a cidade
italiana. A série de imagens faz parte da coleção da Biblioteca Nacional
e foi incluída na mostra para dar aos visitantes uma noção do que
Pompéia representava para os europeus na época em que Teresa Cristina,
nossa futura imperatriz, era menina.
Pompéia era ponto de peregrinação de Belas Artes
— Pompéia era uma espécie de Meca para todo mundo que estava tentando
algum tipo de formação em Belas Artes ou arquitetura — conta Martha
Vianna, do escritório da União Latina no Rio. — O pai de Teresa Cristina
patrocinou escavações na cidade e, na minha imaginação, ela brincava com
amuletos e vasos antigos no lugar das bonecas.
Se Teresa brincava ou não com os tesouros de Pompéia, ninguém nunca vai
saber. Mas é fato que era cultíssima, aventureira e adorava viajar. A
historiadora Lília Moritz Schwarcz, autora de “As barbas do Imperador”
(Companhia das Letras), deliciosa biografia de Pedro II, conta que o
monarca achava a mulher carola demais, mas mantinha por Teresa uma
amizade e uma admiração profundas. Era notório na corte que o imperador
mantinha um romance com a Condessa de Barral. Mas a imperatriz era sua
grande parceira intelectual.
A coleção Teresa Cristina reúne peças arqueológicas preciosíssimas de um
período que vai do século VII a.C ao século III d.C. Ela já era
imperatriz quando convenceu o irmão a mandar para o Brasil os afrescos,
que foram restaurados pelo italiano Pietro Tranchina. Dois deles mostram
dragões sobre um fundo negro e têm uma aparência bastante incomum,
enquanto a outra dupla traz as cores clássicas dos afrescos italianos:
verde, vermelho e mostarda.
A mostra reúne ainda outras peças, como amuletos em forma de falos —
usados pelo povo de Pompéia para espantar mau olhado — e vasos para
vinho.
— Teresa era uma colecionadora antropóloga, que quis mostrar o cotidiano
de Pompéia — diz Martha Vianna.
(© O
Globo)
Os mimos da imperatriz
Peças de Pompéia guardadas por Teresa Cristina em seu acervo são
exibidas no MNBA
Caroline Menezes
O Brasil tem em sua história uma nobre que, além de
cumprir os encargos de soberana, dedicava-se à
ciência e às artes. Apesar de sua importância, pouca
gente conhece a vida pessoal e o legado da
imperatriz Teresa Cristina, mulher de D. Pedro II,
que se tornou patrona da arqueologia brasileira.
Sempre à sombra do marido, a napolitana que se casou
com o governante por procuração foi responsável pela
reunião de 700 peças dos sítios arqueológicos de
Herculano e Pompéia - cidades que no ano 79 foram
soterradas pelas lavas do Vesúvio. Essa coleção
sobre antiguidade clássica é considerada a maior da
América Latina e está sob a guarda do Museu Nacional
/UFRJ, na Quinta da Boa Vista.
Parte importante deste acervo,
quatro raros afrescos de Pompéia foram restaurados
recentemente, por meio de uma parceria entre o Museu
Nacional e a União Latina, instituição
intergovernamental composta por 36 países. As peças
são o principal destaque da mostra A beleza
revelada, que será inaugurada amanhã para
convidados no Museu Nacional de Belas Artes (MNBA),
no Centro.
Além dos afrescos, a exposição
apresenta vasos de cerâmica, estatuetas, utensílios
domésticos e artefatos religiosos do Império Romano,
como um grupo de amuletos fálicos, e ainda conta com
um DVD que recria digitalmente a arquitetura na
região próxima ao Vesúvio. Também poderão ser vistas
no MNBA gravuras do século 19 que relatam as
pesquisas arqueológicas em Pompéia e Herculano e que
hoje estão sob os cuidados da Biblioteca Nacional.
Segundo a idealizadora da exibição, Martha Vianna,
diretora do escritório da União Latina no Brasil,
embora faça um retrato do que foi a civilização que
viveu em Pompéia, a principal proposta da exposição
é reverenciar a imperatriz Teresa Cristina como
precursora da produção científica brasileira.
- Teresa Cristina herdou da
família, os Bourbon da Sicília, a paixão pela
arqueologia. Quando veio para o Brasil, aos 21 anos,
trouxe consigo alguns itens e depois a coleção foi
aumentando. Ela pessoalmente promoveu escavações nos
sítios e até fez um trabalho de curadoria nos
achados. O maior interesse da mostra é fazer o
público conhecer esta faceta de sua imperatriz - diz
Martha, acrescentando que a coleção cresceu a partir
da permuta permanente de peças feita entre a
imperatriz e seu irmão, o rei Ferdinando II, de
Nápoles.
Ele embarcava para o Rio de
Janeiro os achados das escavações e Teresa se
responsabilizava por enviar para a Europa objetos de
arte indígena brasileira. Como ficou registrado na
troca de correspondência entre eles, o gesto não era
simplesmente uma gentileza fraternal, mas uma
iniciativa concreta de intercâmbio de culturas.
- A
imperatriz, ao invés de visar apenas o valor
artístico das peças, como era costume na época, dava
preferência aos itens que revelavam o cotidiano da
civilização, permitindo uma reflexão sobre sua
cultura - comenta Martha.
Entre as peças que chegaram à
então capital do Império, o conjunto de afrescos
chamou a atenção pela singularidade de sua origem:
três deles faziam parte de um santuário dedicado à
deusa egípcia Ísis, cultuada entre os romanos.
- É dificílimo encontrar
exemplares como estes fora da Itália - explica
Martha.
(© JB
Online)
Projeto ambicioso
A recuperação dos afrescos de Pompéia faz parte de
um ambicioso projeto da União Latina, orçado em R$
2,4 milhões, que pretende recuperar todos os 700
itens da coleção arqueológica da imperatriz. A
primeira etapa, finalizada ano passado, foi
conduzida pelo restaurador italiano Pietro
Tranchina, ao lado da equipe técnica do
laboratório de restauração do Museu Nacional /
UFRJ.
Segundo Martha Vianna, duas das
peças, conhecidas como os afrescos negros, estavam
guardadas em caixas desde 1918. Cobertas com uma
espessa camada de cera, as cores das obras foram
aos poucos reveladas pelo trabalho dos
restauradores.
- A cera era uma antiga técnica
de conservação, mas que não deixava ver como era a
obra de verdade - explica Martha.
Na continuidade do projeto, a
União Latina pretende depois de inventariar e
colocar em boas condições todo o acervo de Teresa
Cristina, publicar um catálogo e fazer uma outra
exposição, desta vez no Museu Nacional da Quinta
da Boa Vista. Para cumprir tamanha tarefa, além de
uma equipe internacional a organização vai
promover cursos de capacitação no Brasil para
formar jovens restauradores.
- Toda esta parte inicial, que
custou R$ 100 mil, realizamos com recursos da
União Latina e do Instituto Italiano de Cultura do
Rio de Janeiro. Estamos esperando conseguir
patrocinador para o resto - explica Martha.
(© JB
Online)