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Barba por fazer, força nos punhos: Steffen era sinônimo de
encrenca
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Antonio de Teffè, que se tornou conhecido como
Anthony Steffen, tinha dupla nacionalidade
e ficou famoso na Itália na mesma vertente
que projetou Clint Eastwood
LUIZ CARLOS MERTEN
Há
15 anos ele estava afastado
do cinema e há quatro morava
no Rio, numa
cobertura no Leblon, onde lutava
contra o câncer que terminou
por vencê-lo,no sábado. Antonio
de Teffè tinha 73 anos. Com o
pseudônimo de Anthony
Steffen,
foi um dos
astros –com Clint Eastwood,
Giuliano Gemma e Franco
Nero – da tendência chamada
de spaghetti western. Os faroestes macarrônicos
podiam ser o
alvo
preferido de
pancada dos críticos,
pelo menos
até que Sergio
Leone desse ao
gênero sua carta
de nobreza, mas
o público adorava
aqueles filmes.
Quando Anthony
Steffen entrava em cena,
envolto
num poncho
surrado e
com aquela barba
por fazer, entrava
algum instrumento
lancinante
de fundo – um trompete,
quase sempre – e a massa já sabia
que o pau ia correr solto. Anthony
Steffen foi sempre sinônimode
encrenca na tela.
Ele próprio sabia disto e, certa
vez, analisando o sucesso dos
spaghetti westerns, arriscou sua
interpretação do fenômeno. Disse
que o mundo estava mudando
nos anos 1960 e, se
os faroeste feitos
na Itália faziam mais sucesso
do que os autênticos, produzidos
pelos americanos, é porque
eram mais cruéis, mais verdadeiros.
"Eram duros e extremamente
realistas", disse Steffen.
Na
sua fase áurea, ele era um figurão de
1,90m e olhos
azuis que enlouquecia
as platéias femininas e
os homens respeitavam porque
era mal-encarado. O fato de ter
morrido no Brasil não foi acidental.
Steffen, ou Antonio de Teffè,
era ítalo-brasileiro. O ex-caubói
nasceu na Embaixada do Brasil
em Roma, filho do embaixador
Manuel de Teffè, e por isto tinha
dupla nacionalidade. Foi batizado
com o imponente e aristocrático
nome de Antonio
Luís de Teffè
von Hoonbolz,
em homenagem
ao bisavô,
um aristocrata
de origem prussiana
que foi almirante-chefe da
frota brasileira
na época de Dom
Pedro II e que recebeu do imperador
o título nobiliárquico
de Barão
de Teffè.
O
jovem barão
de Teffè foi um
playboy que terminou cooptado
pelo cinema. Em 1954, fez o primeiro
filme, ainda como Antonio
de Teffè – Gli Sbandati, sobre
uma história da 2.ª Guerra.
Desempenhou múltiplas funções
no cinema. Antes de estrear
como ator, foi assistente
de direção de Mauro Bolognini
em
Ci Troviamo in Galeria, de
1953 – e o filme era interpretado
pela jovem Sophia Loren e por
Alberto Sordi. Foi produtor
(Django,
oBastardo, em 1969) e
roteirista (Os
Mil Olhos do Assassino,
em 1974). Em 1965,
quando o spaghetti western já se
tornara o gênero dominante da
produção industrial italiana, foi
cooptado pelo diretor Edoardo
Mulargia, que o convidou para
estrelar um daqueles bangue bangues
filmados nas planícies
de Almeria, na Espanha, escolhidas
pela semelhança com as pradarias
dos Estados Unidos.
Antonio de Teffè gostava de
contar que a única exigência do
diretor foi a de que ele soubesse
montar. Disse que era um cavaleiro
estupendo, mas não era.
Nunca havia montado
num cavalo
e esse foi apenas o começo de
seus problemas com eqüinos.
Mais tarde, durante a rodagem
de um dos 23 spaghetti westerns
que interpretou – quase
sempre, ou sempre, dispensando
dublês –, sofreu um acidente.
O cavalo rodou e caiu sobre ele.
Antonio de Teffè teve de ser hospitalizado.
Pegou ódio de cavalo,
mas seguiu montando, por razões
de ordem profissional.
Esgotado
o ciclo de sucesso do gênero,
ele diversificou sua área
de atuação, mas não deixou de
trabalhar. Um de seus sucessos
longe do western foi um
filme intitulado
O Amante, que não tinha
nada a ver com a adaptação
que o francês Jean-Jacques Annaud
fez do romance de sua
compatriota Marguerite Duras.
O amante de Anthony Steffen
era um garanhão de 50 anos,
por quem se apaixonava uma
noivinha de 19 anos. Não era só
no Velho Oeste que Anthony
Steffen causava confusão.
Estava casado com Cristina e
tinha dois filhos de um casamento
anterior, Manuel, de 32 anos, e
Luiz, de 28, ambos residentes na
Itália. Nos últimos anos, o caubói
que tinha a fama de querer
ser livre e solto, havia-se domesticado.
Após o divórcio do primeiro
casamento, assediado pelas
mulheres, ele dizia que nunca
mais queria saber de comprometimentos
afetivos. Chegou a
dizer: "Não há nenhuma constituição
que nos obrigue a casar".
O mais curioso é que Antonio de
Teffè, ou Anthony Steffen, brilhou numa
fase em que
Clint
Eastwood
também esculpia o mito
docaubói taciturno nos spaghetti
westerns de Sergio Leone.
Clint virou o grande diretor que
todo mundo reconhece. Teffè/
Steffen teve a sorte de Franco
Nero e Giuliano Gemma.
O primeiro ficou famoso como
Django e até hoje vive casado
com Vanessa Redgrave, com
quem dividiu a cena no musical
Camelot. Giuliano Gemma
estrelou
o primeiro spaghetti western
a fazer sucesso no Brasil –
O Dólar Furado– e depois continuou
a freqüentar o gênero, até
que o filão se esgotasse (e a carreira
fosse para o espaço). Os
fãs devem lembrar-se de todos
eles. Vasculhe aí a memória e
lembre-se – Anthony Steffen, como
bom personagem de western
à italiana, não era exatamente
um mocinho.
Mas era chumbo
grosso e foi assim que entrou para
a história do gênero.
(©
O Estado de S. Paulo)
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