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Parafuso aéreo e para-quedas
inventados por Da Vinci |
Mostra no Arte Sesc expõe faceta menos conhecida do artista
Rodrigo Aör
Na definição do dicionário Aurélio, ''gênio'' é o adjetivo apropriado
para descrever pessoas com ''altíssimo grau, ou o mais alto, de
capacidade mental criadora, em qualquer sentido''. Poucos homens na
história da humanidade podem ser assim. Leonardo Da Vinci, um dos
ícones da Renascença, é um deles. Neste caso, no entanto, a definição
mais correta seria concluída pela expressão ''em todos os sentidos''.
Não bastasse ter pintado o quadro mais conhecido do mundo, a
Monalisa, e o mais reproduzido da história da arte, A última
ceia, ele desenvolveu habilidades notáveis na música, no teatro e
na literatura, bem como importantes estudos em engenharia,
arquitetura, anatomia, astronomia e matemática. Menos conhecida do
público em geral, esta última faceta de Leonardo, de cientista e
inventor, estará em foco na exposição Por dentro da mente de
Leonardo Da Vinci, que será inaugurada quarta-feira, no Arte Sesc,
no Flamengo.
A mostra, que acaba de passar dois meses em
exibição em São Paulo, traz 40 modelos artesanais dos inúmeros
inventos do artista, como um de planador de seis metros de largura, um
carro de guerra, ogivas e uma máquina de levantar peso, e uma hélice
em parafuso, que deram origem, mais tarde, ao planador, ao tanque de
guerra, a balas e mísseis, ao macaco hidráulico e ao helicóptero.
- Muita gente não sabe que diversos objetos e
máquinas usados hoje no dia-a-dia são frutos da mente de Leonardo Da
Vinci - afirma o italiano Diego D'Ermoggine, diretor de relações
internacionais da ONG Museu a Céu Aberto, que organiza a exposição em
parceria com a Casa Brasil e apoio do JB.
Os objetos foram desenhados por Da Vinci entre o
final do século 15 e o início do século 16 em cadernos que recebiam
nomes como Código Atlântico, Código Madri 1 e Manuscrito B e que hoje
fazem parte de acervos de bibliotecas, museus ou de colecionadores
como Bill Gates, fundador da Microsoft. Muitos dos inventos não
chegaram a ser construídos pelo artista, o que ocorreria centenas de
anos depois e exatamente da forma como ele havia imaginado, provando
seu enorme talento também para as ciências, disputado por nobres e
governantes de seu período.
- A idéia é tornar realidade os sonhos de Leonardo,
que não saíram do papel. Por ele não ter concretizado a maior parte
dos projetos, demos este título. Como esse cara podia imaginar coisas
que surgiriam 300 anos depois? - pergunta Diego.
A questão também chama a atenção de Ildeu de Castro
Moreira, professor do Instituto de Física da UFRJ e diretor da
Secretaria de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia do
Ministério da Ciência e Tecnologia.
- Os inventos de Leonardo Da Vinci são muito
imaginativos. Pode-se dizer que são previsões geniais de máquinas que,
na época, não tinham como ser realizadas - diz Ildeu, lembrando que,
embora tivesse atitude de cientista, Da Vinci, contemporâneo ao
surgimento da ciência moderna, ainda não havia incorporado os
processos de experimentação sistemática que norteiam o campo de
conhecimento até hoje.
Nada que diminua seus méritos, ressalta o físico:
- Ele conjuga mecânica e sensibilidade artística de
forma muito interessante. Era uma mistura de artista, engenheiro e
cientista. Isso não acontece mais devido à enorme expansão do
conhecimento humano. Não há como um indivíduo reunir tanto
conhecimento - analisa, ressaltando que os equipamentos projetados
usam sempre como força-motriz a natureza ou o homem já que não havia,
na época, outras fontes de energia.
Os modelos expostos no Arte Sesc estarão divididos
em quatro módulos: vôo, hidráulica, mecânica e guerra. Eles são o
resultado de um hobby iniciado há aproximadamente 150 anos e
transmitido através de gerações por duas famílias de artesãos de
Florença, onde o artista viveu durante muito tempo. Através dos anos,
as peças foram aperfeiçoadas pelos descendentes destas famílias, sem
que perdessem as características do projeto original. Esta fidelidade
é levada às últimas consequências. Na produção dos protótipos, são
usados apenas materiais - madeira, ferro e juta, por exemplo - e
ferramentas disponíveis no período em que Da Vinci viveu. Na mostra,
eles serão exibidos junto com cópias dos desenhos originais.
- Os desenhos, por vezes, são pequenos, de cerca de
três centímetros, e aparecem nos cantos das folhas de papel, em meio a
anotações diversas. Eles ajudam a entender um pouco da cabeça do autor
- justifica Diego.
Haverá ainda textos explicativos com informações
históricas e técnicas voltadas tanto para leigos quanto para
especialistas. Para quebrar um possível estranhamento inicial, dado o
visual esquisito dos protótipos, o público poderá também interagir com
alguns deles, entre os quais o que deu origem ao macaco hidráulico e o
mecanismo de pesos e contrapesos, cuja lógica é a mesma dos modernos
elevadores.
- É a primeira vez que esta exposição sai da Europa
com esta dimensão e neste formato. Quem quiser, poderá brincar com
alguns dos equipamentos - conta o diretor do Museu a Céu Aberto.
Por DENTRO DA MENTE DE LEONARDO DA VINCI-Arte Sesc,
Rua Marquês de Abrantes, 99, Flamengo (3138-1343). 3ª a sáb., do
meio-dia às 20h; dom., das 11h às 17h. Visitas guiadas podem ser
agendadas por telefone. Grátis. Abertura na quarta-feira. Até 23 de
março.
(©
JB Online)
Biografia
Leonardo Da Vinci não era apenas uma mente brilhante; era também um
rostinho bonito. Louro, forte e dono de olhos azuis, especula-se que
tenha sido o modelo de Davi, escultura de Verrocchio, seu
mestre em Florença que, superado pelo pupilo, tomou desgosto pela
pintura. Nasceu no dia 15 de abril de 1452, em Anchiano, perto de
Vinci, entre Florença e Piza. Filho do tabelião Piero, que se recusou
a dar-lhe seu sobrenome, passou a ser chamado pelo nome da localidade.
Aos 16 anos, já desenhava e pintava. O batismo de Cristo, de
Verrocchio, foi seu primeiro trabalho importante como aprendiz.
Interessava-se por inúmeros assuntos, dedicando-se simultaneamente a
vários projetos que, não raro, deixava inacabados. Seus desenhos de
anatomia eram considerados melhores que os de Vesalius, grande
anatomista do Renascimento. Em 1482, seguiu para Milão, para prestar
serviços ao Conde Sforza. Ficou na cidade até 1499 para projetar sua
catedral. Acabou projetando uma rede de canais e um vasto sistema de
abastecimento de água.
Nas horas de folga, supervisionava peças
teatrais, organizava festas e sessões de música. Em 1503, começou a
pintar a Monalisa. Para fugir da inquisição, escrevia de forma
que a leitura só fosse possível com a ajuda de espelho. Em 2 de maio
de 1519, já na França, morre nos braços do Rei Francisco I.
(©
JB Online)
Protótipos
Inclinômetro – O instrumento serviria para medir a inclinação de um
plano. Para isso, o inventor imaginou um pêndulo sustentado por quatro
hastes sobre uma base circular. Colocado sobre o plano, o pêndulo se
deslocaria devido à massa do objeto em sua extremidade, mantendo-se
sempre perpendicular à superfície terrestre. Assim, formaria um ângulo
em relação à base a partir do qual a inclinação poderia ser medida.
Material – O objeto seria feito em madeira e um fio.
Embarcação de casco duplo – Trata-se de um
mecanismo de defesa contra ataques ao casco dos navios de guerra. Caso
a embarcação fosse atingida na lateral, estaria a salvo de afundar
pois a água invadiria apenas aquele flanco. O princípio é semelhante
ao das câmaras estanques encontradas nos navios modernos. O projeto
faz parte dos chamados Manuscritos B. Material – Duas paredes de
madeira dividiriam o espaço no interior do casco do navio em três.
Broca vertical – É um dos instrumentos projetados
por Leonardo Da Vinci cujos princípios são os mesmos usados até hoje
em mecanismos elaborados para exercer a mesma função. Ela foi
imaginada para facilitar o trabalho de perfuração profunda do solo com
base em um sistema hidráulico acionado por dois homens. De acordo com
a profundidade a ser perfurada, seriam encaixadas estacas à sua ponta.
Material – Madeira e ferro.
Estudo de asa unida – Baseado nas observações que
fizera das asas dos morcegos, Da Vinci desenvolve o estudo da asa
unida e decide aplicar o conceito em todas as máquinas que projetara
para voar. Este estudo faz parte dos originais incluídos no Código
Atlântico. Material – A asa seria construída com um único tecido,
esticado sobre uma armação de madeira e juncos.
Pára-quedas – O estudo do pára-quedas faz parte do
Código Atlântico, no qual se encontram diversos inventos pensados para
que o homem conseguisse voar. Da Vinci imaginava que, com este
aparelho, uma pessoa poderia se atirar de qualquer altura sem correr
risco. Material – Segundo Leonardo Da Vinci, deveria ser construído em
formato de pirâmide, com cada lado medindo sete metros, e com telas de
linho sustentadas por uma estrutura de madeira.
Parafuso aéreo – É um dos projetos mais famosos de
Leonardo Da Vinci. Segundo o idealizador, seria necessária a força de
quatro homens para girar a peça sobre seu próprio eixo, de forma que
perfurasse o ar para nele se sustentar, levantando vôo. O desenho da
engenhoca está no Manuscrito B e pode-se dizer que ela é o ancestral
do helicóptero. Material – Seria feito com varas de madeira, tela de
linho e fios de ferro em formato de parafuso.
Aparelho para caminhar sobre a água – O pintor foi
um dos muitos homens da época que estudaram uma maneira de andar sobre
lagos e oceanos com a ajuda de instrumentos. O movimento seria
semelhante ao feito para deslizar sobre esquis na neve. O invento
aparece no Código Atlântico. Material – O autor construiria os
instrumentos com madeira. Duas próteses em formato de casco de barco
seriam encaixadas nos pés e dois bastões, usados com as mãos para
impulsionar o corpo.
Planador – O planador imaginado por Leonardo Da
Vinci é o precursor da asa-delta. Desenhado a partir da observação do
vôo dos pássaros, as asas são fixas na parte interna e móveis nas
extremidades, de forma que o piloto pudesse movimentá-las para cima e
para baixo com a ajuda de um mecanismo de cabos e alavancas. O estudo
é mais um que faz parte do Código Atlântico. Material – O planador
consistiria num pano esticado sobre uma armação maleável de madeira.
Mecanismo helicoidal – Concebida para erguer
objetos pesados, a engrenagem é usada até hoje em fábricas tal qual
foi desenhada por Leonardo Da Vinci por ser mais segura e resistente
que máquinas similares. Por isso, se diferencia das outras peças,
aperfeiçoadas ao longo da história. O mecanismo é acionado manualmente
através de manivela, que gira uma roda dentada ligada ao objeto por um
cabo. Faz parte do Código Madri 1. Material – Seria feita com madeira
e um cabo de ferro.
Carro ceifador – Uma das máquinas de guerra
projetadas por Leonardo Da Vinci, o carro seria puxado por cavalos e
teria foices giratórias nas laterais para atingir o inimigo. O
mecanismo seria acionado pelo giro das rodas à medida que o cavalo se
movimentasse. A idéia não é totalmente original. Carro semelhante já
havia sido desenvolvido pelos romanos. Material – O equipamento seria
fabricado com madeira, foices de ferro e cordas.
(©
JB Online) |