Familiares de Vasconcellos Jr.
dizem ter feito contato com jornalista para apurar notícia sobre sua
morte
DA SUCURSAL DO RIO
A
família do engenheiro João José de Vasconcellos Jr. negou ontem que a
jornalista italiana Giuliana Sgrena tenha tido contato com o brasileiro
no período em que esteve no cativeiro no Iraque. Ela foi libertada na
semana passada após um mês de seqüestro.
Nota oficial assinada por Luiz Henrique de Vasconcellos, irmão do
engenheiro que desapareceu em 19 de janeiro em Baiji (norte do Iraque),
afirma que uma jornalista brasileira amiga da família, Lenise
Figueiredo, entrou em contato ontem com Sgrena, no hospital em que ela
está internada em Roma, para ""saber da veracidade da informação" sobre
a suposta morte do brasileiro.
A
notícia de que Vasconcellos Jr. teria sido morto por seus seqüestradores
foi veiculada na semana passada pela agência de notícias italiana Ansa.
A agência atribuiu a informação a "fontes de Bagdá", mas especulou-se
que ela pudesse ter sido fornecida pelos italianos que negociaram a
libertação de Sgrena. A TV Al Arabiya veiculou a notícia ontem. Segundo
o Itamaraty, a fonte da Al Arabiya foi a própria Ansa, e não há
novidades em suas investigações.
Segundo a nota, Sgrena disse, por meio de seu marido, que ""não conheceu
fisicamente João e que não viu nenhum refém no cativeiro. Acrescentou
ainda que não ouviu nada sobre a sua morte, acha essas informações um
absurdo e não sabe de onde vieram as notícias".
Luiz Henrique de Vasconcellos disse que espera organizar até domingo, em
várias cidades do país, manifestações em favor da libertação do seu
irmão, que trabalhava para a empreiteira brasileira Norberto Odebrecht.
O
embaixador brasileiro na ONU pediu a libertação de Vasconcellos Jr.
"Quero fazer um apelo a todos aqueles que possam cooperar para libertar
o refém brasileiro. Não há nenhuma justificativa para o seqüestro de
civis inocentes", disse Ronaldo Sardenberg. O Brasil preside atualmente
o Conselho de Segurança.
Fogo amigo
O
ministro da Defesa da Bulgária, Nikolai Svinarov, disse que uma
investigação mostrou que um soldado búlgaro provavelmente foi morto por
acidente por soldados dos EUA. "Os resultados nos dão fundamentos para
acreditar que a morte de Gurdi Gurdev foi causada por fogo amigo." O
chefe do Exército búlgaro escreveu ao general Richard Myers, chefe do
Estado-Maior das Forças Armadas dos EUA, pedindo uma investigação.
O
premiê búlgaro, Simeon Saxe-Coburg, e o presidente Georgi Parvanov
chamaram o embaixador americano em Sofia. "A confirmação dos fatos
mostra que existem problemas na coordenação e na interação operacional
entre os aliados. A Bulgária vai exigir a punição dos culpados", disse o
presidente em um comunicado.
Em
Bagdá, um porta-voz dos militares dos EUA disse que o foi designada uma
comissão especial para investigar o caso.
Sgrena voltou a discordar, em entrevista ao jornal francês "Le Monde",
do relato dos soldados dos EUA de que seu carro ia em alta velocidade e
que avisos para parar foram ignorados. Alguns políticos italianos dizem
que o ataque foi deliberado. "Acho um absurdo sugerir que nosso homens e
mulheres em uniforme tenham alvejado deliberadamente inocentes", disse
Scott McClellan, porta-voz da Casa Branca.
Em
Balad, ao norte de Bagdá, um carro-bomba explodiu em frente à casa de um
oficial do Exército iraquiano, matando ao menos 12 pessoas. Em Baquba,
insurgentes atacaram soldados e a polícia com um homem-bomba, morteiros
e armas de fogo, matando ao menos dez. O grupo do terrorista jordaniano
Abu Musab al Zarqawi assumiu os ataques.
Em
Mossul (norte), uma professora que foi candidata pela Aliança Iraquiana
Unida, que alcançou o primeiro lugar nas eleições de janeiro, foi morta
no domingo. Um empresário jordaniano foi seqüestrado ontem e solto após
pagamento de 76 mil. (Com
agências internacionais)
(© Folha de S. Paulo)
Erros em postos de controle são comuns
JOHN F.BURNS
DO "NEW YORK TIMES", EM BAGDÁ
Quando a jornalista italiana Giuliana Sgrena foi levada de carro pela
rodovia que conduz ao aeroporto de Bagdá, na sexta-feira, em direção a
um posto de checagem militar americano, ela mergulhou numa situação
repleta dos perigos enfrentados diariamente por milhares de iraquianos.
Sgrena, de 56 anos, passou por um tiroteio americano acirrado que a
deixou ferida por estilhaços de bomba no ombro e matou o agente de
inteligência italiano que estava sentado a seu lado. A jornalista tinha
sido solta 35 minutos antes pelos seqüestradores iraquianos que a
mantiveram refém durante um mês, e o carro que a conduzia ao aeroporto
estava dirigindo na escuridão total.
Mas as condições eram aproximadamente as mesmas enfrentadas por todos os
motoristas civis perto de comboios ou postos de checagem americanos. Os
soldados americanos operam sob regras de combate que lhes conferem a
autoridade necessária para abrir fogo sempre que tiverem razões para
acreditar que eles possam estar correndo o risco de ataques suicidas ou
outros.
Relatos diários compilados por firmas de segurança ocidentais detalham
muitos incidentes em que iraquianos aparentemente sem quaisquer conexões
com a insurgência são mortos ou feridos por tropas americanas.
Os
comandantes americanos freqüentemente destacam aspectos do comportamento
dos motoristas que despertaram suspeitas de ataque terrorista, e os
sobreviventes muitas vezes afirmam que não estavam fazendo nada.
As
autoridades americanas e iraquianas dizem não dispor de cifras sobre
essas baixas. Mas qualquer ocidental que trabalha no Iraque topa com
muitos relatos sobre mortes e ferimentos de motoristas e passageiros
aparentemente inocentes, vítimas de disparos dos soldados americanos.
Os
militares americanos dizem que as mortes de civis são fatos lamentáveis,
mas inevitáveis numa guerra na qual a arma mais mortífera dos
insurgentes vem sendo a dos atentados suicidas. Mas os iraquianos
afirmam que não têm idéia clara de quais são as regras de combate
americanas e acusam o comando americano de não divulgá-las junto ao
público.
As
forças americanas dizem que tomam muitas precauções para garantir a
segurança de civis.
Como as regras visam proteger soldados sujeitos a ataques imediatos,
elas não prevêem que os soldados precisem se comunicar com o comando
superior, por telefone ou rádio, antes de colocarem as regras em efeito.
Num relato de primeira página publicado no jornal para o qual trabalha,
""Il Manifesto", e em entrevistas concedidas a agências de notícias
italianas, Sgrena disse que o carro estava andando a uma velocidade
moderada, que ela não viu luzes de aviso e que o primeiro indício de
problemas que ela viu foi quando o carro foi alvo de ""uma chuva de
balas".
Um
dos piores incidentes aconteceu na noite de 18 de janeiro na cidade de
Tal Afar, a oeste de Mossul, onde um pelotão da 25a Divisão de
Infantaria fazia uma patrulha a pé. O fotógrafo Chris Hondros, da Getty
Images, disse que soldados caminhavam no escuro por uma rua comercial
deserta quando viram os faróis de um carro a cem metros.
Através dos fones de ouvido dos soldados, um oficial lhes ordenou que
barrassem o veículo, e todos ergueram suas armas. Um soldados disparou
três tiros no ar, mas o carro continuou a avançar, disse Hondros, e
então meia dúzia de soldados abriram fogo diretamente contra ele. Os
soldados fizeram pelo menos 50 disparos.
""Eu ouvi choro de crianças vindo do carro", contou o fotógrafo. Em
seguida, ele contou, uma das portas traseiras se abriu e seis crianças
saíram à rua, quatro meninas e dois meninos, um deles de apenas 8 anos.
Eles estavam ensanguentados. Os pais de quatro das crianças estavam
mortos no banco da frente. Seus corpos estavam crivados de balas, e o
crânio do homem estava desfeito. (Tradução
de Clara Allain)
(© Folha de S. Paulo)