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Máfia italiana investiu em máquinas de bingo no Brasil

04/06/08

Waldomiro Diniz, à época Subchefe de assuntos parlamentares da Casa Civil da Presidência da República, na foto com o Senador Magno Malta

PF iniciou investigação há três anos, mas não prendeu os estrangeiros, que criaram uma rede empresas para lavar dinheiro

Marco Antônio Martins

   O escândalo envolvendo o ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Presidência da República, Waldomiro Diniz, surpreendeu a cúpula do governo Luiz Inácio Lula da Silva, mas não a Polícia Federal. Há três anos, a PF tem conhecimento do envolvimento de autoridades públicas com bicheiros do Rio e São Paulo, e ainda mafiosos, que fazem funcionar a máquina do jogo clandestino no país. Relatórios elaborados, aos quais o Jornal do Brasil teve acesso, com base em investigações da Direzione Anti-Máfia (DIA), da Itália, e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificam um emaranhado de empresas, no Brasil e em paraísos fiscais. Tudo para possibilitar a lavagem do dinheiro, obtido com o tráfico de cocaína e heroína, em diversas casas de jogos espalhadas pelo país.

   A estratégia montada pelo italiano Fausto Pelegrinetti indicou como seus representantes os também italianos Lillo Rosário Lauricella e Giuseppe Aronica, além dos irmãos franceses Julien e François Filippeddu. Ambos envolvidos com terroristas na Córsega. O grupo deveria instalar no Brasil as máquinas de bingos para ''lavar'' o dinheiro da venda na Europa de drogas vindas da Colômbia, Bolívia e Peru.

   Em 1997, dois grandes carregamentos chegaram à Itália: uma remessa de 900 quilos de cocaína e uma outra de cinco mil quilos que saíram dos portos brasileiros. O dinheiro arrecadado nas capitais européias com a cocaína e a heroína seria aplicado na compra de componentes eletrônicos para a confecção dos caça-níqueis.

   Para isso, o grupo mafioso investiu US$ 8 milhões. O projeto dos criminosos previa investimentos no Rio, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e São Paulo. Coincidência ou não, esses cinco Estados são aqueles em que o jogo mais se desenvolveu no Brasil.

   - A opção deles pelo jogo de azar vem das dificuldades da Receita estadual ou federal, de verificar o real lucro do negócio, uma vez que o dinheiro que entra na contabilidade vem de apostas em ''trocados'' - comentou um dos investigadores da denominada ''máfia dos bingos''.

   Os investimentos entravam no Brasil através de uma offshore, a Sisal International com sede na Ilha Jersey, um paraíso fiscal no Canal da Mancha. A Sisal era a principal acionista da empresa Burgcon do Brasil.

   Administrada por Francisco Javier Garcia, de acordo com a Polícia Federal, a Burgcon, ao ser inaugurada, tinha um capital acionário de US$ 500 mil. De repente, houve um salto que levou o capital social para US$ 500 milhões. Em associação com outra empresa, a Cirsa, a Burgcon injetou dinheiro no Brasil para a comercialização de máquinas de caça-níqueis.

   A certeza de impunidade, por parte do grupo, no território brasileiro, levou os agentes italianos a registrarem um flagrante que comprova a associação entre eles: Lillo Lauricella e François Filippeddu foram fotografados pelos homens da DIA, conversando numa manhã ensolarada, em pleno Parque Lage, no Rio.

   No ano seguinte, ao ser preso, Lauricella virou um colaborador da Justiça e confidenciou que os mafiosos pagavam US$ 80 mil ao contraventor paulista Ivo Noal para que as máquinas entrassem em São Paulo. No Rio, o acerto era feito com a cúpula do jogo do bicho. Após uma cirurgia plástica, Lillo Lauricella seguiu para Caracas, na Venezuela, onde cuidava de quatro cassinos. Acabou morto, numa emboscada, nas ruas da capital venezuelana, com sete tiros. Filippeddu continua foragido.

   Com as investigações, a Burgcon mudou sua razão social para Brasleisu do Brasil Ltda. Numa busca e apreensão na sede da empresa, uma agenda com o nome de autoridades foi encontrada. Até agora, nada foi investigado.

   - Infelizmente, no Brasil, as investigações andam na velocidade de uma lesma reumática - comentou o juiz Walter Maierovitch, ex-diretor da Secretaria Nacional Anti-drogas (Senad).

(© JB Online)


O início foi com Castor

   A presença de mafiosos no Brasil e sua relação com o jogo do bicho não é bem uma novidade para as autoridades policiais. Pode-se dizer que o assunto começou a ser tratado com Castor de Andrade e chegou ao seu ápice com a investigação da Polícia Federal sobre a atuação dos mafiosos e os jogos de bingo no Brasil.

   O acordo entre os mafiosos e os capi do jogo no país começou com a associação da empresa espanhola Cirsa e a C.A. Informática, do Rio, que pertencia a Castor, uma das lideranças do jogo do bicho no Estado. No acerto entre eles ficou combinado que eles produziriam e exportariam as máquinas de caça níqueis conhecidas como máquinas eletrônicas programadas, as MEPs, identificadas como a banda ''B'' no negócio dos jogos. Esses equipamentos são instalados em bares e padarias.

   A banda ''A'' são as máquinas mais sofisticadas e modernas que, atualmente, estão nos bingos espalhados pelo país. A maioria delas seria da Recreativos Franco. É por este equipamento que os estrangeiros fizeram acordos com os bicheiros no Rio, identificados por eles, em depoimentos à Justiça italiana, de ''cúpula do Rio''.

   Aliás, para a implantação do esquema mafioso no Brasil, a polícia italiana pediu a prisão de 58 pessoas, entre espanhóis, italianos e franceses. Deste total, 20 estiveram em território brasileiro. A maioria se aproveitou da fragilidade da vigilância da Tríplice Fronteira, em Foz do Iguaçu, entre Brasil, Paraguai e Argentina, para entrar no país.

   Em território brasileiro, alguns como turistas, abriram empresas que ajudaram no esquema de lavagem de dinheiro nos bingos

(© JB Online)


Prêmios sob suspeita

   Em meio ao fechamento dos bingos, na última sexta-feira, um deles chamou a atenção da Polícia Federal, no Rio. Com base no inquérito policial 008/2001, da Delegacia de Crime Organizado e Inquéritos Especiais, apura práticas criminosas no Bingo Arpoador. Uma das irregularidades estaria no pagamento dos prêmios.

   Alguns dos beneficiados, de acordo com a suspeita dos policiais federais, estariam usando a premiação para sonegação fiscal ou lavagem de dinheiro. Um dos casos investigados trata de Renato Bezerra, que no período de janeiro a dezembro de 2000 obteve R$ 344 mil em prêmios.

   Na planilha que apresentou na PF, Bezerra aparece como ganhador de 15 prêmios num único dia. Ele também conseguiu a façanha de ganhar 71 premiações no mês de março de 2000, num total de cerca de R$ 115 mil. Ou seja, pelo apresentado, ele recebeu uma média de dois prêmios a cada 24 horas no interior do Bingo Arpoador.

   Também chamou a atenção dos policiais federais, no relatório elaborado no inquérito, o pagamento de prêmios a algumas pessoas investigadas por lavagem de dinheiro pela Polícia Federal. Uma delas seria Marlene Chueke, proprietária da Casa de Câmbio Laino Turismo.

   Marlene é cunhada de José Henrique Chueke, investigado pela Drug Enforcement Agency, a agência americana de combate às drogas, por remessa de dinheiro do tráfico de drogas para o exterior, através da Casa de Câmbio Paladium.

(© JB Online)

 

Para saber mais sobre este assunto (arquivo ItaliaOggi):

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