A
CULINÁRIA ITALIANA
Azeite, Divino Sumo
DA MITOLOGIA GREGA ÀS
PÁGINAS DA BÍBLIA, O AZEITE SE TORNOU A MAIOR RIQUEZA AO REDOR DO
MEDITERRÂNEO E SE ESPALHOU PELO MUNDO DANDO MUITO MAIS SABOR À VIDA
Rafael Tonon
Conta a mitologia grega
que, quando as primeiras cidades começaram a se formar, houve um tumulto no
Olimpo. Todos os deuses queriam se tornar protetores das novas urbes que
surgiam e, muitas vezes, dois ou mais deles acabavam reivindicando a guarda
de um mesmo povoado. Uma das mais conhecidas disputas foi por Atenas.
Poseidon, o deus do mar, e Atena, a deusa da sabedoria, queriam se tornar
guardiões da cidade. Para decidir quem seria o escolhido, Zeus, senhor do
Olimpo, propôs um desafio: aquele que desse aos habitantes o presente mais
precioso, se tornaria guardião de Atenas. Poseidon fez brotar do solo uma
fonte de água salgada do mar para servir à população. Atenas, por sua vez,
fez germinar do chão uma oliveira. Olhando os dois presentes, Zeus
considerou a árvore mais útil para os habitantes e deu a Atena a guarda da
cidade. O mito mostra como a oliveira é representativa para os gregos. Eles
acreditavam que a árvore tinha origem divina: só podia ser coisa dos céus
uma planta que gerava frutos que serviam de alimento para os homens e cujo
óleo aliviava a dor dos soldados feridos nas batalhas.
O fato é que o azeite vem fazendo parte da alimentação do homem há pelo
menos 3800 anos, quando já era largamente consumido na Mesopotâmia. Está
presente nas mesas não apenas dos países banhados pelo Mediterrâneo,
mundialmente conhecidos pela fabricação dos azeites tradicionais (e que
ainda representam quase 90% da produção mundial), mas também nas de nações
tão diferentes como Argentina, China, Japão e Austrália. Ao longo do tempo,
o mundo todo se rendeu ao sabor e às propriedades do sumo das oliveiras.
Importância religiosa
Várias referências ao óleo de oliva também aparecem na Bíblia. Considerada
uma das riquezas do povo hebreu ao lado do vinho e do trigo , a oliveira é
símbolo da benção divina, da prosperidade e da perseverança. No Antigo
Testamento há uma passagem que con ta que, depois do dilúvio, Noé mandou uma
pomba para ver se a água já tinha baixado. Ela voltou com um ramo de
oliveira no bico, indicando que o mundo estava novamente tranqüilo por isso
a ave com a planta se tornou o símbolo mundial da paz. Jesus invariavelmente
ia buscar forças no Monte das Oliveiras, próximo a Jerusalém. No mesmo dia
em que foi capturado, ele foi rezar com seus discípulos em Getsêmani do
hebraico o lugar da prensa do azeite.
Até hoje, os judeus cultivam o hábito de acender as velas do menorá
[candelabro sagrado] com o óleo de oliva para celebrar a Chanuca [festa das
Luzes, próxima ao Natal]. A iluminação de lugares sagrados com o azeite
passou de uma civilização a outra, de cristãos a mulçumanos, tanto que o
sumo é citado também no Alcorão, escreve o pesquisador Luciano Percussi no
livro Azeite: História, Produtores, Receitas. Mas a grande
representatividade do azeite nessas religiões teria sido ditada muito mais
por conta das características das regiões onde elas foram fundadas do que
propriamente por seu caráter sagrado.
As primeiras oliveiras, segundo os arqueólogos, surgiram no sul do Cáucaso
(entre o mar Cáspio e o mar Negro). De lá, se propagaram para a Mesopotâmia,
o Egito, a Grécia e a Itália civilizações que se tornaram berço das grandes
religiões. Foi na região do Mediterrâneo, porém, que a olivicultura mais se
desenvolveu, por conta de seu clima mais ameno. Olivais coloriram de verde a
paisagem de muitas partes da Itália, da Espanha e de Portugal e se tornaram
fonte de alimentação de seus povos.
Até hoje, os três países são os responsáveis por produzir as variedades de
azeite mais apreciadas do mundo. Esses países, entre outras regiões do mar
Mediterrâneo, herdaram a cultura milenar de extrair o óleo puro das
oliveiras, respeitando as tradições passadas de geração a geração, afirma o
chef francês Yann Corderón, especialista em culinária mediterrânea. Eles se
aprimoraram na arte de produzir o melhor azeite. Não é à toa que o sumo
produzido nessas regiões seja conhecido como ouro líquido.
Bom para o coração
As nações banhadas por essas águas de azul celeste, inclusive, são
consideradas as que seguem uma das alimentações mais saudáveis do planeta.
Desde a Antiguidade, os povos mediterrâneos sempre consumiram o azeite. Mas
só em 1970 o médico americano Ancel Keys resolveu pesquisar os hábitos
alimentares e o estilo de vida dessas populações. Como na época qualquer
tipo de gordura era considerado inimigo da boa saúde, ele ficou estarrecido
ao descobrir que esses povos baseavam suas refeições em 40% de gordura e
mesmo assim tinham ótimos índices de pressão sanguínea e elevada expectativa
de vida. Alguma coisa não estava encaixando nessa equação.
Foi então que ele descobriu que, além dos cálices de vinho que eles sorviam
em quase todas as refeições, gregos, italianos, espanhóis e franceses, entre
outras populações, tinham no azeite a base de toda a gordura que ingeriam.
Ficou comprovado, então, que o consumo regular do óleo de oliva ajuda a
prevenir doenças cardiovasculares, já que é uma gordura monoinsaturada,
responsável por varrer o colesterol ruim das artérias. Isso faz dele um tipo
de gordura único, com uma composição química diferente dos outros óleos,
especialmente quanto aos antioxidantes nos quais ele é o mais rico. O azeite
retirado da oliva é de longe mais saudável. Ele contribui na prevenção da
diabetes, de atrite reumatóide, AVC (derrame cerebral) e câncer de cólon e
mama, pois é rico em fitoquímicos e vitamina E, explica a nutricionista
Roseli Rossi.
Desde o Egito antigo, o líquido extraído das azeitonas era usado na cura
de vários males
Mas não é só. O azeite, como já foi dito, é um poderoso antioxidante. Por
ser produzido do fruto e não do grão ou do caroço, como a maioria dos outros
óleos, ele herda das azeitonas essa característica. Como elas estão expostas
ao ar e, assim, precisam se proteger do oxigênio, as azeitonas acabam
sintetizando maior quantidade de antioxidantes.
Sabores e aromas
Engana-se quem pensa que o azeite só serve para regar saladas e pizzas. Se
em algumas receitas ele entra como coadjuvante, servindo apenas como
condimento, há pratos em que sua presença é fundamental. Ou você já imaginou
uma suculenta bacalhoada à portuguesa sem uma farta quantia do óleo dourado?
Ou então uma típica paella que não tenha sido regada com um fio generoso de
azeite extravirgem espanhol? O sabor certamente perderia um ingrediente
especial.
Basta um filete do líquido da oliveira para que aquele pedaço de pão ganhe
uma nova textura, a sopa tenha outro aroma, o peixe receba um brilho
especial, o refogado ganhe um dourado a mais. Os azeites aromatizados (com
condimentos, cascas de frutas e especiarias) ampliaram ainda mais o cardápio
para o óleo de oliva. As possibilidades são infinitas: eles acompanham
marinadas, assados, grelhados e, para surpresa de muitos, também pode ser
usado em doces, biscoitos, tortas e massas. (Vai aqui uma dica culinária:
substituir a manteiga pelo azeite ao fazer um bolo ou uma massa, além de ser
mais saudável, permite que o alimento seja conservado por mais tempo
novamente, graças aos antioxidantes.)
Mas, longe das mesas e das panelas, o óleo de oliva também já foi
aproveitado para além das refeições. O azeite, quem diria, era usado para
tratar a pele e o cabelo dos antigos egípcios e ainda tinha utilidade na
preparação de perfumes, cujas fragrâncias (pétalas de rosas, canela, cravo
etc.) eram maceradas no líquido. Já os gregos usavam-no como óleo de
massagem, aproveitando suas propriedades emolientes. Eram comuns banhos com
azeite.
Desde o antigo Egito, também, o líquido extraído das azeitonas era usado na
cura dos mais variado males. Muitos ungüentos foram pre parados tendo-o como
base para aliviar dores, diminuir inflamações e tratar problemas da pele.
Claro que a medicina tratou de mostrar que muitos dos usos do azeite não
passavam de crendice popular apesar de muitas pesquisas hoje mostrarem sua
aplicação no combate à gastrite, prevenção de tumores e problemas ósseos.
Para além de mitos e verdades, uma coisa é certa: quando os dias estão
carecendo de um sabor especial, basta um fio do óleo de oliva para azeitar a
vida. Tempero melhor não há.
(©
Vida Simples)
RECEITAS
Entrada:
Saladinha ao Mare
Ingredientes:
Azeite de oliva extra virgem
100g de salmão cru
Suco de um limão-siciliano
200g de camarões médios
200g de lulas pequenas
1 dente de alho socado
2 colheres de sopa de salsa bem picada
Sal
Limão-siciliano
Modo de preparo:
Corte o salmão em lâminas bem finas, tempere com o suco do limão-siciliano,
cubra com filme e leve à geladeira por algumas horas. Descasque e limpe os
camarões e cozinhe-os no vapor. Retire a pele das lulas e a barbatana
interna. Lave-as bem e corte em anéis. Cozinhe por cinco minutos em bastante
água fervente salgada e escorra. Limpe o polvo. Cozinhe em panela de pressão
por 45 a 60 minutos em bastante água fervente salgada. Escorra e corte em
pedaços pequenos. Mantenha os peixes em local aquecido, de modo que não
esfriem. Coloque todos os peixes em uma tigela grande, tempere com o alho, a
salsa picada, o sal, o limão e regue com o azeite de oliva extra virgem.
Serve quatro porções.
Prato principal:
Pesto à moda de Gênova acompanhado de Bifes à
Pizzaiola
Pesto à moda de Gênova
Ingredientes:
120 ml de azeite de oliva extra virgem
1 xícara de chá de folhas de manjericão
15 g de pinoli
2 dentes de alho descascados
1 colher de sopa de queijo pecorino ralado
300 g de talharim fresco
Sal grosso a gosto
Modo de preparo:
Desfolhe o majnericão, lave as folhas e enxugue bem. No liquidificador, bata
o alho junto com os pinoli, acrescente as folhas de manjericão e em seguida
o azeite. Continue a colocar azeite até conseguir bater sem dificuldade.
Adicione o parmesão e o pecorino ralados e, por último, o sal. Bata sempre
aos poucos, ligando e desligando o liquidificador, para não aquecer o pesto.
Cozinhe a massa em pelo menos três litros de água fervente. Escorra,
reservando um pouquinho da água do cozimento e passe para uma travessa.
Dilua o pesto com a água do cozimento da massa, tempere com o molho e sirva.
Serve três porções.
Bifes à pizzaiola
Ingredientes:
½ xícara de chá de azeite de oliva extra virgem
900 g de bifes de filé mignon
2 dentes de alho inteiros
1 kg de tomates pelados batidos no liquidificador
1 colher de sobremesa de orégano
Sal e pimenta-do-reino moída a gosto
Modo de preparo:
Bata os bifes até ficarem bem finos e abertos. Leve ao fogo uma frigideira
com o azeite de oliva extra virgem e os dentes de alho. Frite rapidamente os
bifes dos dois lados, tempere com o sal e com a pimenta-do-reino e reserve.
Coloque o purê de tomates na mesma frigideira e tempere com sal e
pimenta-do-reino e cozinhe por cerca de 10 minutos. Leve os bifes de volta à
frigideira para que absorvam o sabor do molho. Pulverize o orégano sobre os
bifes, passe para uma travessa e sirva. Serve seis porções
Sobremesa:
Abacaxi em emulsão de azeite, beijinhos de laranja
e strudel de bananas
Abacaxi em emulsão de azeite
Ingredientes:
1 colher de azeite de oliva extra virgem
1 abacaxi maduro
1 colher de mel de acácia
100 ml de vinho moscatel
Açúcar de confeiteiro e canela em pó
Corte o abacaxi em quartos, no sentido longitudinal, e
coloque em uma vasilha para que o suco escorra durante alguns minutos.
Reserve o suco e leve o abacaxi à geladeira. Faça uma emulsão com o azeite
de oliva extra virgem, o suco do abacaxi reservado, o mel e o vinho
moscatel. Separe o abacaxi da casca com cuidado, para não quebrá-la. Corte a
fruta em fatias e recoloque sobre a casca, alternando a posição das fatias
como numa escadinha. Regue com a emulsão preparada. Decore polvilhando com o
açúcar e a canela. Sirva acompanhando com uma bola de sorvete de creme.
Serve quatro pessoas.
Beijinhos de laranja
Ingredientes:
2 gemas peneiradas
1 xícara de chá de suco de laranja-pêra peneirado
2 xícaras de chá de açúcar
1 xícara de chá de leite
5 colheres de sopa de azeite de oliva extra virgem
1 colher de sopa de raspas de casca de limão-siciliano
2 xícaras de coco fresco ralado
Açúcar cristal
Modo de preparo:
Coloque em uma tigela as gemas e o suco de laranja. Bata durante dois
minutos. Ponha o açúcar, o leite e o azeite de oliva em uma panela. Leve ao
fogo e cozinhe, mexendo por cerca de 15 minutos. Junte então as gemas com o
suco de laranja, as raspas de laranja e de limão e o coco ralado. Continue
cozinhando até o fundo da panela aparecer. Retire do figo e ponha para
esfriar. Faça bolinhas, passe pelo açúcar cristal, ponha em forminhas e
sirva.
(©
Vida Simples)
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